domingo, 11 de setembro de 2011

FUGIR DA ARMADILHA DO “SE”



Complicações emocionais com as pessoas não são a única maneira de prender perigosamente a nossa sobriedade a algo estranho. Alguns de nós temos a tendência de colocar outras condições à nossa sobriedade, mesmo sem intenção.

Um membro de A.A. diz: “Nós, bêbados"*, somos gente muito cheia de “se”. Quando bebíamos usávamos uma porção de “se” como usávamos de bebidas alcoólicas. Mitos de nossos devaneios começavam assim: “Se ao menos...” e estávamos sempre dizendo que não nos teríamos embriagado se alguma coisa ou outra tivesse acontecido ou que não teríamos problemas com a bebida se ao menos...”“.

Todos nós acrescentávamos ao “se” as nossas próprias explicações (desculpas?) para nossas bebedeiras. Cada um de nós pensava: eu não estaria bebendo assim...

* Alguns de nós do A.A. referimo-nos a nos mesmos como “bêbados”, não importa a quanto tempo não bebamos. Outros preferem o termo “alcoólicos”. Existem bons motivos para ambos. “Bêbado” é sempre alegre, tende a desinflar o ego, relembra-nos de nossa tendência para a bebida. “Alcoólico” é igualmente honesto, embora mais significante e mais adequado à noção atualmente bastante difundida e aceita que alcoolismo é uma enfermidade perfeitamente respeitável e não um desregramento intencional.

Se não fosse minha mulher (marido, namorada ou namorado)... Se tivesse mais dinheiro e menos dívidas... Se não fossem todos esses problemas de família... Se eu não estivesse sob tanta pressão... Se tivesse um emprego melhor ou uma casa melhor para morar... Se as pessoas me compreendessem... Se este mundo não fosse tão nojento... Se todo mundo não esperasse que eu bebesse... Se não fosse a guerra (qualquer guerra)... E assim por diante, indefinidamente.

Recapitulando esse modo de pensar e o comportamento daí resultante, verificamos, agora, que estávamos deixando que circunstâncias alheias a nós controlassem muito de nossas vidas.

Quando paramos de beber, muitas dessas circunstâncias retornam aos devidos lugares em nossas mentes. Em nível pessoal, muitas delas realmente se tornam claras tão logo nos iniciemos na sobriedade; e, algum dia, começamos a ver o que podemos fazer com as outras. Enquanto isso, nossa vida fica muito, mas muito melhor mesmo, na sobriedade, não importa o que possa acontecer.

Mas, então, depois de certo tempo de sobriedade, chega, para alguns de nós, um belo dia em que – plaft! – nova descoberta nos dá um verdadeiro tapa na cara. O mesmo modo de pensar, cheio de “se” dos nossos tempos de bêbados, sem que o sintamos, penetrou em nossa vida de abstenção. Inconscientemente, colocamos condições à nossa sobriedade. Começamos a pensar que a sobriedade é ótima, se tudo for bem, se nada der errado.

Com efeito, estamos ignorando a natureza bioquímica imutável de nossa enfermidade. O alcoolismo não respeita “se” nenhum. Ele não se afasta nem por uma semana, por um dia, por uma hora sequer, deixando-nos não-alcoólicos e capacitados a beber outra vez em alguma ocasião especial ou por um motivo extraordinário – nem mesmo por uma única comemoração em toda a vida ou se estivermos presos de enorme dor; nem se chover canivetes ou se as estrelas caírem. O alcoolismo para nós é incondicional, não admitindo dispensa por preço nenhum.

Pode levar um pouco de tempo fazer penetrar essa convicção até a medula de nossos ossos. E, às vezes, não reconhecemos as condições que inconscientemente vinculamos à nossa recuperação até algo sair errado, sem culpa intencional de nossa parte. E então, de súbito, eis a coisa. Não estávamos contando com este acontecimento.

A vontade de beber é natural em face de um desapontamento chocante. Se não conseguimos o aumento, a promoção ou o emprego com que estávamos contando; se nossa vida amorosa anda atrapalhada; se alguém nos trata mal..., aí podemos ver que, durante todo o tempo, estivemos confiando em que as circunstâncias nos ajudariam a querer permanecer sóbrios.

Em algum lugar, escondida num remoto cantinho de nossa massa cinzenta, conservamos uma pequenina restrição – uma condição para nossa sobriedade. E ela só estava esperando para atacar. Nós íamos, todos felizes, pensando: “Sim, a sobriedade é uma beleza, e eu tenciono conserva-la”. Nem sequer ouvíamos a sussurrada restrição: “Isto é, se tudo correr como eu quero”.

Esses “se” estão além de nosso controle. Temos de permanecer sóbrios, não importa como a vida nos trata, não importa... se os não-alcoólicos apreciem a nossa sobriedade ou não, temos de manter nossa sobriedade a despeito de tudo o mais, não dependente de pessoa alguma, nem sujeita a quaisquer circunstâncias ou condições.

Freqüentemente, temos verificado que não podemos ficar sóbrios por tempo suficiente só por causa da mulher, do marido, dos filhos, do namorado (ou namorada), dos pais, dos outros parentes, de um amigo; nem por causa de um emprego; nem para agradar o patrão (ou o juiz, o médico, o credor); nem por causa de ninguém mais, a não ser nós mesmos.

Vincular nossa sobriedade a qualquer pessoa (mesmo a outro alcoólico recuperado) ou a qualquer circunstância é insensato e perigoso. Quando pensamos: “Ficarei sóbrio se...” ou “Não beberei por causa de...” (preencha com qualquer motivação diferente de nosso próprio desejo de recuperar-nos de gozar de boa saúde), involuntariamente começamos a beber tão logo a condição ou a pessoa mude. E qualquer uma delas pode variar a qualquer momento.

Independente, não afiliada a qualquer outra coisa, nossa sobriedade pode crescer bastante para nos capacitar a enfrentar as circunstâncias e as pessoas. E, como você verá, começaremos a estimar tal sentimento também.



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