Para fazer um minucioso e
destemido inventário moral de nós mesmos era necessário ser honesto e
honestidade não me faltou na realização do mesmo. Posso dizer que fiz quase uma
autobiografia. Lendo o que havia escrito recordava o tempo em que, durante
minha infância, andava angustiado e aflito em saber que para fazer minha
primeira comunhão teria que me postar, de joelhos, em um confessionário e, por
uma discreta janelinha contar ao mesmo meus pecados. Eu vivia imaginando mil
pecados e a eles dava enorme gravidade até que chegou o dia fatal. Era preciso
ter coragem. Chegou o meu dia e a minha hora de falar sobre tudo quanto eu
acreditava ser pecado. Fui ao confessionário e falei desembestadamente e,
confesso, temia qual seria o veredito do padre. Seria o de rezar mil Pai nossos
e mil ave Marias? Só em pensar no veredito do mesmo e de imaginar ter que rezar
tanto eu já me sentia pecador. Pois contei minhas peraltices, traquinagens e
estripulias e o padre, que pacientemente me ouvia me mandou rezar UM PAI NOSSO
e uma AVE MARIA. Sai contente, com um riso contido e feliz da vida. A alma estava
lavada e produzia em mim uma leveza nunca dantes experimentada. Voltemos,
então, a meu destemido inventário. Estava no quarto passo e, tal qual o guri
aflito e angustiado que deveria comparecer ao confessionário eu sabia que
deveria admitir perante Deus, perante a mim e perante a outro ser humano a natureza
exata das minhas falhas. Foi ótimo e, novamente, após efetivar o quinto passo,
experimentei a sensação de estar levitando com os pés no chão.
Deixei meu destemido inventário
intacto. Todos têm o costume de queimá-lo. Eu queimei o que não devia e mantive
o mesmo inteiro. Sabia, mas não tinha chegado lá, que um dia haveria de fazer
reparações e, em meu inventário havia algo que eu achava que, para ser honesto
de verdade, precisaria contar a esposa. Como de viva voz eu não conseguia fazer
isso decidi colocar o caderno com tudo o que havia escrito para que ela, movida
pela curiosidade, lê-se tudo e ficasse sabendo de um caso de infidelidade, de
ter mantido um relacionamento furtivo, depois de casado. Sabe, esta honestidade
me custou tão caro e eu imaginava que o resultado seria semelhante aos dois
anteriores, quando realizei minhas confissões. Deveria ser legal lermos um
destemido inventário moral da esposa, mas esposas não escrevem esses
inventários e os coloca diante dos esposos para que, assim procedendo, façam
uma reparação indireta.
De qualquer sorte, com todos os
problemas causados, nas duas vertentes, eu fiquei feliz comigo mesmo por ter
sido indiretamente honesto e, depois, diretamente honesto na hora do
interrogatório, que não cessa. São tantas as
sessões e tantas as perguntas repetidas que vinha um arrependimento danado de
ter levado minha honestidade tão a sério. Mas que fazer depois de feito? Meu
inventário é um livro aberto e por ser aberto ninguém mais tem interesse em
pega-lo para ler. Então, senhoras e senhores, fiz uma confissão pública e
peço desculpas e perdão, publicamente, a todos, especialmente a ex, pelo meu comportamento inadequado, enquanto marido que cometeu um deslize. Só por hoje !
Nenhum comentário :
Postar um comentário
soporhoje10@gmail.com