segunda-feira, 25 de julho de 2011

Formas de Tratamento da Dependência Química (“Adicção”) – Álcool e Drogas

Formas de Tratamento da Dependência Química (“Adicção”) – Álcool e Drogas

Gustavo Amadera 

Como boa parte da minha especialização dentro da psiquiatria é voltada para a área da Dependência Química, recebo um número crescente de familiares (e pacientes, às vezes…) querendo iniciar o tratamento “antes que seja tarde demais”.

Neste breve texto gostaria de esclarecer o correto fluoxograma na busca pela ajuda de pacientes dependentes químicos:

1) Nos casos em que o indivíduo aceita a existência do problema antes de pensar numa internação, uma boa avaliação psiquiátrica, o início de um tratamento psicoterápico, muitas vezes com a recomendação de iniciar a participação em grupos de mútuo-ajuda (N.A., A.A., e para as famílias Amor Exigente, todos presentes em virtualmente qualquer cidade do país família deve parar antes mesmo de procurar a orientação de grupos de Amor Exigente, de agirem como facilitadores – muitas vezes as orientações são duras e difíceis de serem implementadas quando se tratam de famílias cujos pais não vivem juntos mais, e ocorre triangulação com avós e outros parentes. Os pacientes que têm a experiência da transformação pela qual passam, os pais que frequentam Amor Exigente têm um termo engraçado para designar o mesmo “amor-ferra-a-gente” rsrs, não havendo o menor sinal de progresso, ou se percebendo que a aceitação do problema era algo superficial, com o intuito de ganhar tempo e espaço para a persistência no uso (como é comum pacientes meus de consultório alegarem para os pais mais fragilizados “mas eu to fazendo tudo direitinho, estou indo no psiquiatra e na terapia!”) entramos na próxima modalidade de intervenção, exposta no próximo item.

OBS – estamos falando de pacientes cujas famílias não dependem do atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), onde a porta de entrada para o tratamento em localidades onde o recurso existe seriam os CAPS-ad (Centro de Atenção Psicossoial para pacientes com problemas decorrentes do abuso e dependência de substâncias)tão importante quanto a existência física de tal serviço é a qualidade do mesmo -  já que denúncia da pesquisa do CREMESP publicada recentemente apontou que nem metade dos serviços existentes possui médico psiquiatra (quanto menos especializados em dependência química!)… Então, aos familiares e pacientes cabe a fiscalização, cobrança e denúncia de serviços inadequados, assim como o fariam caso estivessem pagando diretamente um hospital ou clínica particular – somente neste momento poderemos sonhar em ostentar a mesma qualidade dos programas do Ministério da Saúde de tratamento da SIDA (alardeada como o melhor sistema do mundo!).
2) Nos casos em que o paciente não aceita o prejuízo causado pela droga, ou que não aceita o tratamento oferecido (e requerido, do ponto de vista médico!)  [continue lendo]



Oferecer ao paciente a possibilidade de uma internação voluntária em alguma clínica psiquiátrica para desintoxicação- os convênios médicos cobrem 15 dias para tal, somente, quando muitas vezes mais de um mês após o último uso da substância os exames toxicológicos sanguíneos mostram ainda a presença de drogas na circulação sanguínea! Neste caso é ineressante notar que as (raríssimas e concorridíssimas) vagas disponibilizadas pelas entidades que atendem pelo Sistema Único de Saúde não costumam ter esta limitação de tempo – sendo em muitos aspectos superiores às clínicas que atendem convênios, infelizmente são poucas as especializadas neste tipo de tratamento.

Em se tratando de alcoolismo com sintomas físicos de abstinência (a Síndrome de Abstinência ao Álcool é uma das mais graves entre as diversas substâncias, com os característiscos sintomas de disautonomia, com tremores de extremidades e base de línngua, picos hipertensivos em indivíduos não hipertensos (ou piora do quadro hipertensivo nestes), taquicardia, taquipnéia, sudorese, podendo evoluir dependendo do caso com confusão mental e alteração do nível de consciência, com risco de coma e parada cardiorespiratória. Muitas clínicas, especialmente particulares, aceitam qualquer tipo de internação, mas a estrutura de uma clínica que possa tratar com segunrança estes tipos de casos deve contar com no mínimo os seguintes componentes:

Estrutura de enfermagem completa, 24 horas, com enfermeiro devidamente registrado no COREN e habilitado para conseguir acesso venoso em caso de deterioração do nível de consciência, com administração de doses de benzodiazepínicos em quantidade suficiente para restabelecer o balanço entre os sistemas inibitórios (GABAérgico, que recebe forte ação do álcool, e quando na sua privação entre em total desesquilíbrio) e excitatórios (glutamatérgico), impedindo a progreção para quadros convulsivos e ao risco da hipertensão levar a acidentes vasculares cerebrais, ou mesmo a insuficiência respiratória demandar a intubação orotraqueal profilática do paciente – um estrutura tal que pode ser responsável pelo salvamento (ou não) da vida do paciente…

Médicos clínicos de referência, seja presencial, seja em plantões à distância, com contatos em P.S. Clínicos da região (não ficando na dependência da boa vontade de profissionais que atendem nos P.S. públicos, que costumam recusar avaliações de pacientes que estariam já internados em serviços de saúde – o que não confere com a legislação atual, que permite através de RDC 101 a existência de unidades de reabilitação não médicas, e nem gerenciadas por médicos!

Médico Psiquiatra especialista em dependência química, que esteja presente quase todos os dias na Clínica em questão, e disponível para ser contactado e levado à Clínica em qualquer situação de urgência Carros para transportes sempre disponíveis.

A garantia, prevista em contrato, de um mínimo de atendimentos psiquiátricos completos e especializados mensais (digo no mínimo para os menos frequentes 30% dos casos em que não se identifica nenhuma comorbidade psiquiátrica associada ao quadro psíquico do paciente), e a garantia, também prevista em contrato, de um encaminhamento pós-alta médica para a continuidade do tratamento conforme definido pela equipe responsável pela condução do caso durante a internação.

Apesar de ser uma das áreas com maior repercussão social (sabe-se que a maior parte dos dependentes que conseguem a recuperação abandonam eventuais envolvimentos com atos ilícitos pregressos!), infelizmente as manchetes não nos deixam esquecer que ainda existem depositários humanos, onde as famílias sequer tem acesso às instalações da clínica em questão. Dica pessoal: DESCONFIE dessa atitute! Exija conhecer todas as instalações do serviço, inclusive as áreas de isolamento ou contenção. Avalie atentamente o que é oferecido em contrato, e sempre cobre dos administradores tais pontos. As clínicas em que trabalho permitem inclusive às famílias visitantes que conversem com outros internos, uma das maneiras mais seguras de saber onde estará deixando seu ente querido…

Infelizmente, em muitos momentos não será possível acompanhar o paciente à Clínica, a família ficando com uma situaçao ainda mais delicada nas mãos – chamar uma equipe de resgate para transferir o mesmo. Em se tratando do SUS, o SAMU só viria buscar pacientes para levar a internação caso a polícia militar faça a devida escolta, e ou o paciente aceitar a remoçao, ou estiver sem condições de decidir por isso. Infelizmente o caso da dependência química dentro das limitações do SAMU acaba ficando para o fim da lista de prioridades… Existem diversas empresas de remoção “especialilizadas” no mercado, considero essa fase da intervenção bastante crítica – muitas vezes constitui a “1a impressão” que o paciente terá do tratamento como um todo, então sempre busque indicações e informações pormenorizadas a respeito (recomendo as empresa Radar Remoções e Higienópolis Remoções)

Diferencie as chamadas Comunidades Terapêuticas (quer sejam as ligadas às várias religiões, quer sejam as administradas e operadas por indivíduos que cumpriram tratamentos semelhantes, buscaram formação técnica, e hoje coordenam o trabalho de reabilitação) de Clínicas de Reabilitação e de Clínicas Psiquiátricas Gerais que também atendem dependentes químicos. São recursos diferentes, veja bem:
Comunidades Terapêuticas são regidas por portaria específica da ANVISA (RDC101), onde o tratamento segue o tradicional modelo Minnesota, inicialmente adotado pelos Alcoólicos Anônimos, e depois pelos Narcóticos Anônimos, oferece um programa ao mesmo tempo simples e bem elaborado de 12 passos rumo à recuperação plena. Nestes serviços os pacientes permanecem por tempos predeterminados em contrato – o tempo para cumprir um programa pré-estabelecido pela equipe técnica responsável. Dentre as Comunidades Encontramos realmente muitos problemas, geralmente o profissional psiquiatra especializado não participa das determinações da condução do caso, em algumas ocasiões tais decisões são divididas com o psicólogo responsável. Não existe crítica à este modelo, existe de minha parte a advertência tanto a pacientes em busca de ajuda quanto para famílias desesperadas com o problema que enfrentam em casa: façam uma boa pesquisa, visitem o lugar, façam questão de conhecer o psiquiatra responsável (quando existir, e conselho pessoal – fujam dos serviços que não contarem com um médico psiquiatra disponível!) e o psicólogo responsável (idem!). Sejam claros durante a entrevista com os responsáveis acerca de como é feito o tratamento, se exitem agressões físicas ou verbais, e se possível tentem conversar com pacientes internados ou com suas famílias. Como o regimento não é feito pela Lei 10.216, não cabendo intervenção do CFM ou CFP, aqui existem mais casos de serviços despreparados ou inadequados para a reabilitação. Recomendo o C.R. Portal de Luz, C.R. Primeiros Passos, Clínica Libélula, C.R. Recanto das Garças)

Clínicas Psiquiátricas Gerais – cuidado novamente, nestes casos também recomendaria a exigência de conhecer as instalações, os médicos responsáveis, e se existem plantonistas disponíveis 24h. Atualmente indico esse tipo de tratamento (e não indico nenhuma clínica específica, infelizmente!) somente para breves períodos de desintoxicação, e sempre na dependência de equipe 24h médica disponível, para conseguir auxiliar o paciente a passar pelo período de abstinência inicial de maneira menos sofrida. São regidas pela Lei 10.216. Posso recomendar a Clínica Conviver, a C.S.Nossa Sra. de Fátima e CAISM (Clínica Psiquiátrica da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo)

Clínicas de Reabilitação – Clínicas de Reabilitação são registradas no CREMESP, possuindo um médico psiquiatra como Diretor-Clínico, quem em última análise define o projeto terapêutico a ser adotado. Os atendimentos são oferecidos por psicólogos especialistas em dependência química, em muitos casos aliando terapia individual e terapia em grupo, além de dinâmicas com todo o grupo (ou partes) abordando a questão da espiritualidade. A laborterapia é algo mais direcionado – os indivíduos apredenderam a cuidar de seu espaço, mantendo-o asseado e organizado. Geralmente existem atividades físicas supervisionadas por professor de educação física, além de enfermeira padrão gerenciando equipe de enfermagem completa 24h/dia. São igualmente regidas pela Lei 10.216, e diferente das comunidades terapêuticas, as decisões acerca de tempo de tratamento entre outros pontos são individualizadas, sendo avaliado caso a caso.

A decisão de intervir em qualquer familiar ou funcionário dependente químico é algo delicado. Sempre que possível converse com algum profissional de confiança e isento, que poderá encontrar a melhor forma de tratamento indicada. Mas não se furte a intervir hoje, enfrentando resistência e ofensas as mais variadas tanto do paciente quanto de parte da família, às custas de um arrependimento futuro quando da prisão ou morte do indivíduo causada ou ligada às drogas!

Boa sorte!

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