sexta-feira, 8 de julho de 2011

Relembrando Tim Lopes, matéria sobre clínicas para dependentes químicos

25/03/02 - 00h00 - Atualizado em 25/03/02 - 00h00

Depósito de pacientes

As clínicas prometem cura sem tratamento médico. É a exploração de quem chegou ao fundo do poço. "Eu fui cada vez me afundando mais, vendi tudo dentro de casa, chegou na clínica eu achei que era uma coisa, mas era outra", conta um dependente. Nossa equipe esteve em clínicas consideradas de má qualidade pelo Conselho de Entorpecentes do Rio.Com uma câmera escondida o repórter Tim Lopes do Jornal Nacional percorreu o circuito de uma pessoa viciada a procura de recuperação. Três clinicas. Dez dias de internação. O primeiro contato com o mundo dos absurdos acontece logo na entrada. Não é preciso mostrar documento e nem sequer dar o nome. Não existe acompanhamento médico. "Não temos psicólogo, o nosso trabalho é um trabalho religioso, um trabalho com a alma, com o espírito", diz um funcionário da clínica. "Não tem psicólogo, médico não existe lá", diz um interno. Um aposentado ficou uma semana na clínica. Logo no primeiro dia descobriu que o tratamento era quase desumano. "De manhã é uma cevada muito ruim com angu. No almoço um arroz mal feito". Ele conta que tentou pedir socorro para a família, mas foi proibido pelo dono da clínica de usar o telefone. "Acho que eles não querem que a família vá lá, para a pessoa não ver o lugar", desconfia a filha do paciente. Quando a filha descobriu a situação, tentou resgatar o pai. Mas encontrou resistência. "Eu ainda tentei negociar com eles. Eu disse que meu pai só tinha passado sete dias, vou ter que pagar R$ 120. Aí ele disse que era para pagar R$ 200, mas que ia quebrar meu galho", conta. As clínicas onde nossa equipe esteve cobram de R$ 100 a R$ 400 por mês. Quantas são as clínicas para tratamento de drogados no Brasil? Ninguém sabe ao certo. Um levantamento preliminar da Secretaria Nacional Anti-Drogas contou mais de 2 mil. Mas podem ser muito mais. Porque elas funcionam quase sempre sem nenhuma fiscalização, nenhum controle, como uma na Baixada Fluminense. Lá são mais de 60 internos, que não precisaram se identificar na chegada. Por isso, o lugar serve também de abrigo para quem não está procurando tratamento, e sim um esconderijo. "Eu comandava um morro, matava, roubava, tirava vida", conta um traficante. Nosso repórter comprovou que - mesmo sendo proibido - os internos fumam livremente no pátio da clínica e nos alojamentos. E a única terapia é rezar e capinar. "Trabalho com enchada, corto árvore", conta um interno. Em uma das clínicas alguns pacientes chegam a ficar presos. "Eu acho um desrespeito, uma falta de ética, são verdadeiros depósitos humanos com o pior de todos os fins. É a ganância pura, ganhar dinheiro em cima do sofrimento humano", diz Maria Thereza Aquino, psicóloga da Uerj Uma portaria do governo federal deu um prazo até maio do ano que vem para as clínicas se adaptarem a uma série de exigências - entre elas a presença permanente de um profissional de saúde de nível superior. Segundo o levantamento da Secretaria Nacional Anti-Drogas, atualmente apenas 78 clínicas em todo o Brasil podem ser consideradas de boa qualidade.

Nenhum comentário :

Postar um comentário

soporhoje10@gmail.com

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...