terça-feira, 20 de maio de 2014

CIDADE DOS ESQUECIDOS - JABÁ PSIQUIÁTRICO


ANDREA DIP

 “Se em 1992, no Brasil, havia 83.000 leitos em hospitais psiquiátricos financiados pelo SUS, com recursos da ordem de 250 milhões de reais por ano, hoje, com 42.000 leitos, o SUS gasta 460 milhões por ano. Acrescentem-se os mais de 200 milhões com outros gastos que continuam a funcionar na lógica espaçocêntrica, clientelista e privativista. Desse total, 80 por cento continuam a ser destinados ao setor privado, os chamados ‘empresários da loucura’. 

Na sua maioria, empresas familiares que agregam pequenas fortunas acumuladas em especial com recursos públicos, e que praticamente não se submetem à lógica do capital de risco.

O lucro é certo – seja pelos baixos salários pagos, pela insuficiência dos recursos aplicados, pela má qualidade de alimentação e de higiene”, diz o doutor Nacile. E completa: “A representante sindical do setor psiquiátrico privado, a FBH, Federação Brasileira de Hospitais, é um dos lobbies mais freqüentes junto ao Congresso Nacional e ao Ministério da Saúde, e constantemente ameaça paralisação e fechamento para conseguir aumento nas diárias hospitalares”. 

Outra grande incentivadora do atual modelo é a indústria farmacêutica, que, com a ajuda da mídia, divulga novas doenças e instantaneamente sua cura por meio do remédio tal. Fato confirmado por psiquiatras, como Renato Del Sant: “Se não existisse o Fantástico, não existiria a medicina. De segunda-feira, o consultório é cheio! O que vem de fora é o apelo das drogas da felicidade”. E acrescenta:

“A psiquiatria hoje está seguindo muito o modelo americano, que é mais medicamentoso. E nós somos muito americanófilos, aceitamos fácil o que vem de lá. Vêm coisas boas, realmente, mas eu aviso os meus residentes: não deixem de estudar a psiquiatria européia, que trata mais o lado humano, psicoterápico. Porque é fácil difundir o modelo americano, que vem com uma propaganda poderosa da indústria farmacêutica. 

Um psiquiatra que vai falar na mídia sobre determinado tratamento e medicamento recebe grande apoio da indústria farmacêutica, é mais fácil de ele aparecer. E um médico que vai falar de um tratamento existencial não tem apoio”. 

Paulo Amarante, também psiquiatra, faz parte desses que Del Sant chama de humanistas. Ele diz que é muito difícil desenvolver uma pesquisa que não envolva algum tipo de medicamento. “As pesquisas são financiadas diretamente pelos laboratórios, e vendidas para os próprios. Eles contratam os pesquisadores. O resultado dessa pesquisa é confidencial e entregue à empresa farmacêutica. A indústria vai julgar se o resultado é divulgável ou não. Se considerar que o resultado prejudica a visão do remédio, não divulga. E se o cara publicar qualquer coisa, está frito. Isso deveria ser proibido. 

Outra questão é a propaganda médica. Os laboratórios pagam viagens aos médicos e suas famílias, botam na primeira classe de aviões, em hotéis caros. Pagam tudo, dão prêmios. Esse gasto é repassado ao consumidor. Então você tem remédios que custam 600, 800 reais a caixa. Qual foi o custo? Não foi só o da produção, foi também do investimento que o laboratório faz em psiquiatras que o receitam.”

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