quarta-feira, 22 de junho de 2011

CONTINUAÇÃO DE CARTA DE UM ADICTO DENUNCIANDO CLÍNICA

(...)
Minha saúde reclama cuidados e tratamento urgente. Isto, querida esposa, queridos filhos, vocês não levaram em conta, nem eu, em minha euforia para me internar com tamanha boa fé, acreditando em todos vocês e julgando que me amam e só me querem bem. O frio - a estação invernosa que se aproxima, me apavora. O outono está se finando e, com ele, neste lugar, temo o que será o inverno. Este município, em que esta clínica de araque se encontra, parece ser mais frio que a cidade de São Paulo. Fica perto de São Roque onde existe uma estação artificial para quem deseja esquiar... Minha dentição reclama tratamento. Tenho plano odontológico e vocês não precisam gastar um centavo comigo. Basta que estejam jogando dinheiro fora nesta clínica que merece ser fiscalizada, com pente fino, pelos poderes públicos competentes. Minha adaptação vai de mal a pior. A pressão arterial subiu, outro dia tive uma infecção dentaria e, após uma sessão de tosse escarrei sangue. Isso me preocupou, até porque aqui - quando faltam copos plásticos - colocam um copo para toda a coletividade e quando este falta, internos recorrem aos copos postos no cesto de lixo. Horrivel, não é mesmo. É a realidade daqui, da má administração. Outro dia cortaram a SKY por falta de pagamento. Não há algo de estranho nessa clínica?
Mas falemos de saúde: se algo de mal me ocorre como serei socorrido se na casa inexiste profissionais de saúde habilitados. Soube, por internos, que o dono prescreve medicamento para internos como pratico em medicina. Isto, em centros civilizados é reconhecido como exercício ilegal da medicina. Pior é que os medicamentos são colocados em copinhos por um interno, que era usuario de crack e, tais medicamentos são conduzidos até a sala, onde será ministrado em clima de balburdia, por um GAP, interno e que usava crack. Eles usam uma colherinha para fazer o coquetel de remédios e a colherinha é a mesma para todos os copinhos. Imagine a beleza com que são ministrados os medicamentos. Enquanto isso, no recinto, há briga para saber que deixou no ar o mau cheiro de uma "bufa" não identificada. O monitor diz que aplicará castigo caso descubra donde saiu a bufa. Rídiculo este estabelecimento. 
De tudo o que mais me impressiona é a prepotência do dono (cujo nome omito sistemáticamente) que adquiriu poderes sobrehumanos junto às famílias dos internos e como consegue manobralas com seu papo digno do melhor charlatão. Sujeito maquiavélico que não oculta isto dos internos. Preocupa-me o fato dele poder, arbitrariamente, me deixar em regime de incomunicabilidade com meus familiares alegando que tal medida faz parte do tratamento que ele aplica. O sujeito é um louco que diz que para sair da clínica dele tem que ser superior a ele 4 vezes mais. Converso com poucos colegas e todos são concordes em dizer que o cara é louco. Todos já sofreram nas mãos dele. Tem um baiano, lá jogado porque fumava maconha, que ele chama de "gazelinha" em franco desrespeito ao mesmo, que, de certo modo, é alienado. Recolho-me, face o frio, logo após tomar o medicamento. Tem uma TV no quartinho de passagem e vejo o jornal nacional. Fixo-me no quadro que informa sobre o tempo. 
Muito tenho a lhes revelar, filhos, mas nesta carta mal redigida, feita clandestinamente, mal redigida, não me permite contar tudo. Aqui inexiste critério de justiça e o que funciona, já disse, é a lei do talião. São muitas as tentativas de fuga deste inferno e ninguém consegue êxito. Recapturados são punidos com torturas físicas dentro do chamado quartinho do pânico.O dono obriga todos a dizerem que são bem tratados. Se nos telefonemas alguém pede ajuda, logo tem a ligação cortada e sofre sanções. Bem, filhos, iniciei esta cara falando da história que meus pais me contavam quando garoto do menino que brincava de mentir e finalizo do modo como iniciei a mesma. Sou um ex-usuário de drogas que, mediante carta, como se estivesse diante de vocês, postado de joelhos e implorando socorro, pedindo socorro qual o garoto que morreu afogado face a descrença. Estou em apuros aqui dentro face minha natureza e procuro a todo custo ser disciplinado e tenho engolido sapos. Caso seja real o desejo de vocês buscarem me tratar de modo correto, este não é o lugar. Estou disposto em continuar em recuperação, largando inclusive o cigarro, caso ponha meus pés fora desta clínica que merecia estar fechada. Imploro a vocês minha saída daqui; peço-lhes perdão e espero que me libertem deste lugar demoniaco com a mesma confiança que lhes creditei ao entregar meu destino a vocês. Espero apenas a reciprocidade e que não me deixem afogar em meu pedido de socorro.
Do pai e esposo que muito lhe quer,

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