terça-feira, 27 de março de 2012

GAROTO COCAÍNA

GAROTO COCAÍNA

Neste beco não há saída.
Seu traficante estará aí?
Hoje teremos uma noite fria.
Por que você não vai descansar e ver...
Tudo que uma noite de sono pode fazer.
Você é só memória.
Você é só lembrança.
Meu garoto cocaína.

Estou desfocado hoje.
Procurando uma razão.
Procurando um amigo.
Estou em volta do meu umbigo.

O morro nunca esteve tão pra baixo.
Essa ladeira nunca levou tão pra baixo.
Um inferno inteiro.

Seus cortes infeccionaram.
Seu nariz sangra como uma garota menstruada.
Seu dinheiro queima como fogo cru.
Você tem uma arma?
Você deveria ter uma arma contra si mesmo.

Você é só um fantasma.
Você é só um espectro.
Você é só você mesmo.
Meu garoto cocaína.

Drenando sua loucura.
Aspirando um mundo invisível.
Cheirando à merda.
Seu cão lambeu sua cara com nojo.
Seu vômito tem tudo, menos comida.
Por que você não faz um bem a si mesmo?
E some deste mundo para sempre.
Você...
Você...

            Escrevi isso há tempos. Assim me via, assim era. Fato. E a cada vez que relia, mais doía. Parecia que seria assim no início apenas. 5 anos, e só piorava. 10 anos, o inferno consumia. 15 anos, desilusão. Chega-se então em 2011, eu pego esse texto e, perplexo, notei que era o mesmo... apenas (bem) mais velho. 20 anos de vício, de dor, de consumação, auto-piedade, sofrimento. 20 anos devotados a uma deusa inócua... cocaína.
            Às vezes eu não sabia onde eu terminava e onde a cocaína começava. O que era meu sangue ou o que era o sangue dela. Se eram minhas lágrimas ou a droga cuspindo através de mim. Muitas vezes meu nojo era do mundo, evoluía até se tornar raiva da droga e o gran finale era o ódio flamejante de mim mesmo, expressado através dos inúmeros cortes pelo corpo, as poças de sangue pelo chão, os pratos com resto de cocaína sendo lambidos com sofreguidão... queria mais e mais droga dentro do corpo, queria vomitar até a exaustão, desmaiar e bater a cabeça... a morte era ansiada, cortejada, desejada. Nessas horas o traficante vira Deus, pois nem sair de casa eu conseguia. Ele mandava as doses diárias de morte até mim.
            Não sou mais garoto. Não sou mais um monte de cocaína. Mas preciso ler esses textos pra lembrar de onde vim e para onde não quero voltar nunca mais. Eu era uma coisa. Hoje sou alguém.


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