terça-feira, 22 de março de 2011

Resposta sem destinatário certo

Pois é, companheiro, lí suas verdades com atenção mas para você tudo parece ser simples, como se eu fosse um ser exato, calculável, previsivel, como uma mera equação matemática.
Viver o dia a dia, com determinados direitos, como o de comer, beber e satisfazer as necessidades fisiológicas parece ser suficiente, além do amor de pai e mãe. Mas companheiro, como fica um cara sem amor de uma esposa e sem o calor da sua família nuclear? 
Será que vivo em uma zona de conforto, o de desconforto, ou, quem sabe, em um meio termo, vez que o amor de pai e mãe não são despreziveis e eles também estão sozinhos. Este é um desconforto que me tira do meu próprio foco. Estão velhos. O conforto deles é relativo. Tem telefone fixo e móveis, mas falta quem lhe telefone na própria familia nuclear que eles constituíram.  Eles estão com o poder de mobilidade reduzido. Minha cota de contribuição estou dando há muito tempo, desde antes da minha drogadição que, duas vezes por semana vinha fazer-lhes companhia, passando a noite e deixando a esposa em casa, sozinha. Dos filhos eu não era o único a ter uma família, o único a ser casado, mas, diferentemente dos outros vinha dormir com eles, suprindo a deficiência que eles têm de alguém para lhe fazer companhia e auxiliar no que for necessário. Creio que meu dever filial foi cumprido à risca.
Com minha drogadição tive que solicitar apoio e me tornar residente em uma clínica de recuperação. Levei 45 dias até a minha saida. Tinha meus planos e metas e imaginei que retomaria minha vida normalmente. Um interno, ou residente, durante sua estadia em uma clínica de recuperação sente muita saudade dos familiares e idealiza muita coisa e quando sai, sai temente em relação aos riscos potenciais de recair e recomeçar aquela vidinha infernal, outra vez, repetindo tudo.
Esperei que todos, incluindo esposa, me vissem com bons olhos. Minha estadia em casa de meus pais, que deveria ter uma duração de 40 dias e mais um mês que passaria fora, viajando com a esposa, ultrapassa a marca de um ano. 
Não me separei de ninguém, apenas fui separado de tudo para tornar-me companhia, em tempo integral, dos meus pais. De certa maneira viramos uma especie de "cuidador" e esta é uma condição que facilita a vida e redime a consciência de muita gente.
O argumento de não voltar ao lar para conviver com a esposa ainda é, apesar das contradições, o de que voltaria a usar tudo, outra vez, afinal, perto tem pontos de venda. Ora, a cidade inteira tem postos de venda e, contrariado com a persistência do argumento, provoquei minha primeira recaída, exatamente para revelar que a questão de usar não se prende a circulo geográfico que se cria em torno do lar, como impeditivo. A crença seria a de que afastado de lá eu deixaria de usar. Ledo engano. Onde habito existe a cracolândia ee tudo mais que se imagine. Não há lugar pior para ficar que onde me encontro, se o argumento é o da fuga geográfica. Bem, o fato de recair propositalmente gera inúmeras insanidades que a droga causa. Existe o nosso componente reprimido, mas as drogas tem um poder de alterar a personalidade sem alterar a boa índole. Refiro-me principalmente a questão da violência que dizem estar associada ao uso e, eu digo que esta é uma abordagem superficial e simplista. A questão da violência é muito mais complexa e, evidente, vai alcançar pessoas utilizadoras de qualquer droga, para a pratica de atos considerados violentos e criminosos. A droga pode estimular a má indole, mas não justifica o ser violento. Não justifica o crime, assaltos e tudo mais. Por outro lado, vamos e convenhamos, traficante que vende fiado não procede como o comerciante que acredita na boa fé de todo mundo? O que eu quero dizer é que traficante que vende fiado não tem o direito de cobrar divida alguma. A divida que ele tem é com a própria burrice. Coisa de otário, como usar drogas e compra-las para uso, também é um troço de otário. Pois bem, há na sociedade milicianos e grupos que são denominados de "de exucução". Estes grupos, somados àqueloutros mencionados, fazem um festival de violência em todos os recantos do Brasil. Não é fenomeno localizado. Alguém é morto de morte matada e a imprensa logo vai dizendo: estava envolvido com drogas, ou tinha divida com traficantes. Olha, não é bem assim. Muita gente está morrendo sem ter nada a ver com estas coisas. A vida de qualquer pessoa perdeu o valor. Banalizou-se a violência. Mas não quero tratar deste tema pois não me diz respeito e é tema para experts.
O que eu queria dizer é que, minha vida sofreu uma profunda mudança e, aquilo que deveria ser para melhor, não prosperou. Tive várias recaídas e a última gerou em mim um despertar de sobriedade. Digamos assim, um certo surto de sobriedade e faço o mea culpa e peço desculpas publicamente a qualquer pessoa, a toda a sociedade, do mais pobre miserável ao mais rico dos senhores, aos governantes, aos policiais e, até mesmo aos traficantes e viciados. Generalizo meus pedidos de desculpas. Reparações tenho que fazer inúmeras, bem sei. Mudar tenho mudado e venho mudando. Em meu redor ninguém precisa mudar nada e, tenho que aceitar tudo como resultante da "minha doença". De certa maneira esta minha visão parece masoquisata, como o ter que estar focado em mim mesmo compreende uma forte dose de individualismo e indiferença com o próximo que deveriamos amar como a nós mesmos. É algo bem egoísta que aceitamos durante este processo de lavagem cerebral que, indiscutivelmente, funciona, mas é um processo continuado de lavagem cerebral, para que não conhece e nem compreende o que vem a ser uma lavagem cerebral. Não contesto nada, mas não posso jogar na lata do lixo o meu senso crítico. Aceito os 12 passos, compreendo-os muito bem, mas não posso me transformar em um papagaio doutrinado. Era, no momento, o que tinha a lhe responder. Espero que me compreenda e não me leve a mal. Sim, é verdade, estou me esforçando para continuar em recuperação, tendo que aceitar todos os absurdos, similares àqueles que vimos quando assistimos o filme Bicho de 7 Cabeças, com Rodrigo Santoro desempenhando o papel de vítima de uma família conservadora e desinformada que destrói a vida de um rapaz que tinha tudo para se realizar na vida e toca-la com felicidade. Também, nesta onda de histéria coletiva, há quem passe a obter ganhos com isso e prolifera-se toda uma indústria que irá trabalhar pela recuperação de viciados nisso e naquilo. Significa dizer que a sociedade estrutura-se para tratar das consequências, não da pevenção, nem da repressão. Vamos e venhamos, esta questão das drogas tem muito a ver com diversas modalidades de corrupção que não me convém tratar. A sociedade está apodrecida, mas resta, na alta cupula do poder, muita gente sadia e que sabe exatamente o que estou dizendo e ao que estou me referindo.
Companheiro, alonguei-me demais... sai do eixo do seu post, talvez movido por um poder superior, horizontal e vertical. Voltarei a lhe responder tim-tim- por tin-tim.
Aquele abraço,
Fique na paz do senhor!
Obs.: peço-lhe que publique e proceda a revisão do que foi escrito, mas publique

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