Chega o tempo da exaustão e a grande arma é a oração da serenidade como exercício espiritual. Dentro daquele lugar as pessoas se unem devido as fraquezas e vulnerabilidades e porque pessoas precisam de pessoas. Nas reuniões quase ninguém partilhava e as que partilhavam diziam as mesmas coisas todos os dias.A monotonia entediava. Todos os dias as mesmas caras, os mesmos hábitos. Nos quartos as primeiras conversas eram sobre o que levou cada qual àquele lugar.
Dos mais novos aos mais velhos havia um ponto de convergência: as esposas haviam proporcionado um grande desgosto a quase todos. Invariavelmente a conversa girava em torno de traições amorosas. Muitas vezes ocorriam toques de maldade como o de querer por chifre em cabeça de cavalo. Os relatos, se verdadeiros, são de doer.
Tem os que não guardam segredo e contam suas histórias com honestidade. Outros sequer sabiam o que os outro já sabiam. Noticia ruim corre logo. Era forçado ouvir. Tirar sarro com a desgraça alheia também era comum.
Durante as visitas mensais, haviam mulheres que ajudavam seus companheiros com fazem a diferença. Por amor uma criatura aceitou o plano de fuga do seu companheiro e o ajudou na fuga, esperando-afeto, carinho e palavras de conforto. Também podia-se notar a presença de mulheres frias, como era inevitável perceber a presença das calorosas.
Existem residentes que sequer recebem um telefonema da mulher e os caras só precisam ouvir um "como vai você"? Existem os que recebem as esposas com frieza, quando deviam trata-las com amor.
Todos estão no mesmo barco e o sacrifício de viver confinado, como padres, nem sempre é por amor. Muitos chegaram ao local mediante sequestro. É difícil acordar e ser levado por estranhos a um local desconhecido. O melhor remédio para curar o trauma era rir do que aconteceu, do que se passou e aceitar. Haviam os inquietos e inconformados que logo, logo, planejavam fugas mirabolantes. Fui um deles. Minha fuga nunca aconteceu. Era possível. Mas logo me ocorriam pensamentos terríveis. Fugir de dia não dava. Só durante a noite. Mas correr por dentro do mato, com cercas de arame farpado, espinhos, aranhas e cobras venenosas. Em um dos aposentos foi encontrado uma cobra coral. Em outros aranhas caranguejeiras. Um dia tive um pesadelo louco: uma cobra rastejava em minha cabeça, por dentro dos meus cabelos. Depois não havia dinheiro, nem documento. Meus limites não me encorajavam e, ainda assim, o sonho de liberdade não morre. Não havia o desejo de usar, mas de se libertar e podem cair no lugar comum do discurso da abstinência.
Dos mais novos aos mais velhos havia um ponto de convergência: as esposas haviam proporcionado um grande desgosto a quase todos. Invariavelmente a conversa girava em torno de traições amorosas. Muitas vezes ocorriam toques de maldade como o de querer por chifre em cabeça de cavalo. Os relatos, se verdadeiros, são de doer.
Tem os que não guardam segredo e contam suas histórias com honestidade. Outros sequer sabiam o que os outro já sabiam. Noticia ruim corre logo. Era forçado ouvir. Tirar sarro com a desgraça alheia também era comum.
Durante as visitas mensais, haviam mulheres que ajudavam seus companheiros com fazem a diferença. Por amor uma criatura aceitou o plano de fuga do seu companheiro e o ajudou na fuga, esperando-afeto, carinho e palavras de conforto. Também podia-se notar a presença de mulheres frias, como era inevitável perceber a presença das calorosas.
Existem residentes que sequer recebem um telefonema da mulher e os caras só precisam ouvir um "como vai você"? Existem os que recebem as esposas com frieza, quando deviam trata-las com amor.
Todos estão no mesmo barco e o sacrifício de viver confinado, como padres, nem sempre é por amor. Muitos chegaram ao local mediante sequestro. É difícil acordar e ser levado por estranhos a um local desconhecido. O melhor remédio para curar o trauma era rir do que aconteceu, do que se passou e aceitar. Haviam os inquietos e inconformados que logo, logo, planejavam fugas mirabolantes. Fui um deles. Minha fuga nunca aconteceu. Era possível. Mas logo me ocorriam pensamentos terríveis. Fugir de dia não dava. Só durante a noite. Mas correr por dentro do mato, com cercas de arame farpado, espinhos, aranhas e cobras venenosas. Em um dos aposentos foi encontrado uma cobra coral. Em outros aranhas caranguejeiras. Um dia tive um pesadelo louco: uma cobra rastejava em minha cabeça, por dentro dos meus cabelos. Depois não havia dinheiro, nem documento. Meus limites não me encorajavam e, ainda assim, o sonho de liberdade não morre. Não havia o desejo de usar, mas de se libertar e podem cair no lugar comum do discurso da abstinência.
Havia um companheiro, traumatizado, que vivia a indagar os residentes sobre como era a relação amorosa deles. Para ele, pouco importavam as histórias de cada um, todos eram cornos. O que satisfazia o cara era não ser ímpar. Ele casou seis vezes e foi chifrado por todas seis. Eis a razão pela qual vivia a esculhambar as mulheres, generalizando o que era particular e haja serenidade para atura-lo. Ele dizia que a primeira esposa havia ensinado tudo pra ele. Ela, a esposa dele, chegava tarde em casa e quando ele ia perguntar a razão da demora a esposa enraivecida dizia: - já vai começar? Tá pensando que eu sou igual as putas que você anda? traficante de cocaína, ladrão de carga...
Era bem escandalosa e invertia os papéis. Segundo ele essa era uma técnica que sinalizava que a mulher era infiel. Outro sinal, segundo ele, era quando a mulher o evitava. Ele se achava especialista no ramo. Nesse vai e vem de conversas o cara descobriu que um companheiro pegou a mulher na cama com outro e, não sei a razão, pôs no cara o apelido de "meia-foda". O tio de "meia-foda",também residente , contava que o sobrinho tinha 10 anos de casado e durante sete anos vinha traindo o sobrinho. Pior, contou que a esposa era tão decadente que havia dado, para um cara, em troca de uma carteira de Derby. Baixaria em cima de baixaria.
A legislação não é seguida. Os residentes, na maioria, são desinformados. Direito de comunicação não havia. Tudo era controlado. Comunicar-se só nos dias certos. Visitas de mês em mês. Nada de médico plantonista e nenhum carro para prestar socorro. Qualquer reclamação era recebida como desaforo e a resposta, invariavelmente, era: - quem mandou você usar drogas? Aceitar era a palavra de ordem e tais palavras eram engolidas à seco. O pátio do claustro era "avenida" e o centro do mesmo era "a pracinha". Agora imagine o tamanho do claustro por onde os residentes zanzavam enquanto fumavam? A alimentação era complementada por "lanches" que os familiares de alguns residentes mandavam. Havia um sujeito pobre que tinha tudo do bom e do melhor. Outros não tinham nada a não ser desprezo e, talvez por este motivo, furtassem as merendas dos companheiros. Estado de necessidade? O colchão não era nada bom, mas haviam residentes que tinham dos bons. Travesseiros do mesmo modo. Quartos por demais quentes apesar de possuírem ventiladores de teto. No quarto uma televisão de quatorze polegadas, sem antena e que só pegava a globo muito me serviu para matar o tempo. Isso mesmo: matar o tempo, porque não há tratamento e a recuperação é individual. Só se mantem em recuperação quem conhece o programa dos doze passos e, se assim quiser. A maioria, por ter ingressado de modo involuntário, confessava pelos corredores: - quando sair a primeira coisa que irei fazer é usar. Havia muito rancor dentro de muitos residentes. Os apenas alcoólicos falavam abertamente que ao sair tomariam um belo porre. Não conheço dados estatísticos, mas tudo que é feito contrariando a vontade me parece que não surte resultados amigáveis. Particularmente, cuidei de mim.
Os primeiros momentos foram de enorme revolta. Quando me voltei para mim mesmo, focando-me e buscando diariamente manter minha serenidade, aceitando o que não posso mudar, melhorei. Mas, confesso que no inconsciente ainda existe revolta que devo trabalhar. Essa revolta, infelizmente, está centrada contra meus familiares e este é um dado que a família não gosta. É um dado que causa outro tipo de revolta, gerando a ciranda cirandinha que alimenta recaídas. Os companheiros que me perdoem, mas nesse lance da adicção há algo que transcende minha capacidade de compreensão. Ninguém merece se auto-destruir, suicidando-se lentamente. Não há culpados. Creio no poder superior porque creio no amor, porque acredito nas pessoas, mesmo aquelas que me provocaram qualquer espécie de desconforto. O princípio do perdão é soberano à minha personalidade. Creio na mão dupla e, mesmo quando a mão é única, tenho que aceitar. Voltei mais duro, mais firme e a lição que colhi é que além de me manter em permanente estado de recuperação, preciso tornar-me independente e levar minha vida sem incomodar quem quer que seja. Tenho que refazer e reconstruir muita coisa; tenho que proceder reparações quando chegar o momento. Não posso mentir negando que não tenho feridas na alma. Tenho e buscarei cicatriza-las com toda serenidade possível. Lima Barreto dizia que não haveria próxima vez... a próxima, para ele, que vivia no Rio de Janeiro, era o João Batista, que ficava próximo do hospício onde residiu.
Os primeiros momentos foram de enorme revolta. Quando me voltei para mim mesmo, focando-me e buscando diariamente manter minha serenidade, aceitando o que não posso mudar, melhorei. Mas, confesso que no inconsciente ainda existe revolta que devo trabalhar. Essa revolta, infelizmente, está centrada contra meus familiares e este é um dado que a família não gosta. É um dado que causa outro tipo de revolta, gerando a ciranda cirandinha que alimenta recaídas. Os companheiros que me perdoem, mas nesse lance da adicção há algo que transcende minha capacidade de compreensão. Ninguém merece se auto-destruir, suicidando-se lentamente. Não há culpados. Creio no poder superior porque creio no amor, porque acredito nas pessoas, mesmo aquelas que me provocaram qualquer espécie de desconforto. O princípio do perdão é soberano à minha personalidade. Creio na mão dupla e, mesmo quando a mão é única, tenho que aceitar. Voltei mais duro, mais firme e a lição que colhi é que além de me manter em permanente estado de recuperação, preciso tornar-me independente e levar minha vida sem incomodar quem quer que seja. Tenho que refazer e reconstruir muita coisa; tenho que proceder reparações quando chegar o momento. Não posso mentir negando que não tenho feridas na alma. Tenho e buscarei cicatriza-las com toda serenidade possível. Lima Barreto dizia que não haveria próxima vez... a próxima, para ele, que vivia no Rio de Janeiro, era o João Batista, que ficava próximo do hospício onde residiu.
Em tudo quanto escrevi aqui não há nada de pessoal contra quem quer que seja. Gostei de todos com quem convivi durante 2 meses e 15 dias, adictos e profissionais que cumpriam suas funções. Sabe que tenho saudade de todos? mas não penso em voltar. Há um ponto de exaustão que descobri em mim e este ponto, se ultrapassado, pode significar uma regressão. Também devo salientar que a Dona do local em que estive é simpática, atraente, bonita, prestativa. Chato é que ela colocou na cabeça a idéia de que é possível vencer pela força, não é só pelo lucro. Ressalto que no lugar não ocorriam torturas nem maus tratos, só me incomodava ver os caras serem dopados com "danoninho". O grande lance é que ela não sacou que o modo voluntário de internação é que funciona e que não é o longo tempo que irá recuperar quem quer que seja. Após longos períodos, se tudo no mundo de fora der certo, é possível obter bons resultados, mas pelo que vivenciei, só funciona pra quem quer e não pra quem pode. Chato escrever estas coisas, mas talvez alguém tire algum proveito.
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