Primeira parte:
Fui relutante. Realmente imaginei que poderia controlar a minha vida, do
meu jeito, achava-me suficientemente forte para vencer a luta. Mas não é assim,
do nosso jeito.
Reconheci isto, solicitei ajuda e pedi para ir até uma clínica de recuperação. Já estava
aceitando a idéia de que minha vida estava descontrolada, mas não me reconhecia
incapaz. Chegando na clínica a negação e a racionalização me fizeram voltar prá casa.
Decorridos quinze dias estava de volta à clínica, disposto a me
tratar, de verdade.
Desconhecia a palavra adicção e adicto. Nada sabia sobre o que era a
doença, nem que a mesma era incurável, progressiva e fatal (podemos
controla-la,não se assuste,nem se impressione com esta revelação.
Não somos um "caso perdido"!
Os primeiros dias são dolorosos. É um período de adaptação, de abstinência
total.
Ao entrarmos na clínica ficamos limpos; literalmente limpos, até nossa identidade fica guardada
na administração. Aceitei isso sem reclamar, afinal, precisava de uma nova
identidade, mesmo.
Nos dão um tempinho para nos recuperarmos e logo se inicia uma nova rotina
em nossas vidas, com inúmeras atividades coletivas.
Acordávamos cedo. Tomávamos café até 8:15. Passou da hora, perdeu! Todos nós tinhamos uma tarefa específica. Tinhamos que manter os quartos de dormir limpos, asseados e forrávamos nossas camas.
No ínicio achavamos duro, mas , aos poucos, vamos nos adaptando,enquanto vamos aprendendo.
Ouvimos companheiros partilhando um monte de coisas, que não nos eram
estranhas.
Estava mal pra falar e sequer podia articular o pensamento na hora de falar.
Era como se estivesse com o pensamento desconectado da fala. Imaginei algo tipo
um "curto-circuito" mental. Meu pensamento estava preso, detido na minha cabeça,
querendo sair e não saia. E horrivel sentir-se assim.
Comecei a imaginar o quanto havia me permitido estragar.
A impotência estava estampada em mim e, ainda assim, tinha resistências em
aceita-la.
Mas, aos poucos vamos ficando permeáveis ao tratamento e vamos nos
permitindo aprender.
Nessa altura já estamos mais ou menos ambientados.
Engordei 5 quilos em
cinco dias... Fiquei contente!
Fiquei chocado quando soube o que era adicção e eu era um adicto.
Mas logo compreendi como fui afetado, mental, espiritual e fisicamente
falando.
Sentia muita culpa, vergonha e saudade dos meus familiares. E duro observar
o que havíamos aprontado.
Telofonemas só nas quartas à noite, ou no domingo, pela manhã. Todo mundo ficava na espectativa, esperando a hora de falar com os entes queridos.
Dizem que a liberdade começa a partir do conhecimento da necessidade que
temos de recupera-la. É verdade!
O primeiro passo é como acordar durante um pesadelo.
Queria me livrar da experiência passada, realidade dantesca, cruel e chocante. Ficava
abatido só em lembrar.
Os companheiros falavam e quase tudo era igual e as drogas até pareciam as
mesmas.
Uns tinham ido muito além, outros, felizmente, ficaram no muito menos,
outros nem 8, nem 80.
Mas todos temos algo em comum, que é fruto da doença, que vai saindo pela
boca, enquanto a cura vai entrando pelo ouvido. No meu caso, parece que sela saia
pela boca dos companheiros e a cura chegava através do que ia ouvindo deles.
Não é moleza, não ! logo somos levados a trabalhar a mente e o corpo. O
tempo fica totalmente ocupado com várias atividades terapêuticas.
Pareciamos internos em colégio de padres e freiras. O regime é de respeito
total. A disciplina é algo que se impõe e temos que retomar nossas vidas
readiquirindo bons hábitos e bons costumes. Temos que recuperar a auto
estima.
Começamos o primeiro passo e vamos descobrindo como éramos obssessivos; reconhecemos as compulsões; sentimos vergonha e culpa,
compreendemos o que vem a ser a fase do luto, da negação, da raiva, dependência
química...
Até o dia em que adimitimos e aceitamos que éramos impotentes perante nossa adicção e que tinhamos perdido, mesmo, o controle de nossas vidas.
Até o dia em que adimitimos e aceitamos que éramos impotentes perante nossa adicção e que tinhamos perdido, mesmo, o controle de nossas vidas.
Curioso é que sentimos de verdade um vazio interior.
Sabemos que sózinhos
não podemos, mas alguém pode...
Quando chegamos a jogar a toalha cessa a luta e tudo começa a ficar mais
fácil e aí saltamos para o segundo passo. Mas é uma fase de muita
aprendizagem.
Finalizo dizendo que usei muito a primeira pessoa do plural, quando deveria
falar apenas sobre mim. Então compreendam que este é o meu relato pessoal, do
que foi o meu primeiro passo; sem dúvida, o mais dificil de todos. O segundo
é menos dificil.
Hoje me acostumei com aquelas coisas que repetia todos os dias antes de
falar (EU, fulano...) e ouvir os companheiros retornarem (OI, fulano... valeu, Fulano) calorosamente;essa apresentação, vira ato repetitivo e necessário.
As reuniões familiares são importantes e interessantes. Aprendemos logo a
respeitar o próximo.
É um passo de muitas lições de vida e que imaginava muito diferente;
prejulgava achando que iria estar junto a um montão de pacientes psiquiátricos
e, de modo preconceituso, no meio dos loucos, como um louco, também ; não é nada
disso.
O meu tratamento não foi medicamentoso. Remédio só quando prescrito pelo
médico.
Demorei, mas cheguei ao segundo passo.
Enquanto os dias se passavam íamos vendo os novatos chegando e cada novato
era considerado a pessoa mais importante, até chegar um outro novato.
É a pessoa
mais importante porque os novatos são como nós diante de um espeho. Foi assim
que chegamos ali... É tudo muito parecido.
Eu, LS, limpo há 4 meses, 4 dias, 9 horas !
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