A Lei 6.368/76 considera, em seu art. 12, como criminosa a importação, fabricação, venda, transporte, guarda, consumo, dentre outros, de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Observe-se dispor o art. 36, da referida Lei, serem consideradas substâncias entorpecentes ou capazes de determinar dependência física ou psíquica aquelas que assim forem especificadas em lei ou relacionadas pelo Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e Farmácia, do Ministério da Saúde.
Dessa forma, está-se diante das chamadas normas penais em branco em sentido estrito ou de complementação heteróloga, cujo conteúdo não pode ser deduzido do próprio tipo penal, havendo necessidade de recorrer-se, para sua complementação, a disposições administrativas como é o caso da Portaria nº 344, de 12 de maio de 1998, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde.
Menciona a citada portaria como substâncias de uso proscrito no Brasil, além da cocaína, a maconha, a heroína, etc, também o cloreto de etila (lança-perfume), como psicotrópico, ou seja, substância que provoca alterações de funções mentais indesejáveis, ameaçando a saúde ou modificando o comportamento humano.
Assim, por incluir-se o crime definido no art. 12 da Lei de Tóxicos dentre aqueles ofensivos à incolumidade pública, caracterizando-se por ser de perigo abstrato, em que não se perquire da efetiva ocorrência de dano, tendo como sujeito passivo primário o Estado, nele se insere a importação, venda, transporte etc, do cloreto de etila.
Ademais, a Lei nº 5.062 de 4/7/66 proíbe expressamente a fabricação, comércio e uso do lança-perfume em todo o território nacional (art. 1º e 2º).
Efetivamente, nossa jurisprudência tem vacilado sobre o tema, tendo inclusive a Sexta Turma do Colendo STJ, na Sessão do dia 17 de junho de 1999, desclassificado o lança-perfume como droga análoga ao tóxico ao entendimento de não causar este dependência física ou psíquica apesar de provocar depressão no sistema nervoso. (HC 8.300/PR, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, no mesmo sentido, CC 10590/PR, Rel. Min. Adhemar Maciel, DJU de 24-6-96, p. 22.704, p/maioria, 3ª Seção)
Todavia, data venia, tenho que tal entendimento não reflete a melhor exegese sobre o tema, porquanto a Lei de Tóxicos objetiva previnir e reprimir o tráfico ilícito e o uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica. Sendo que o Ministério da Saúde, atraves da Portaria citada (nº 344/98), apesar de não relacionar o cloreto de etila como entorpecente e sim como psicotrópico (Lista F2), não faz em seu art. 1º, qualquer diferenciação entre os mesmos, considerando ambos como substâncias que pode determinar dependência física ou psíquica e relacionada, como tal, nas listas aprovadas pela Convenção sobre Substâncias Entorpecentes ou Psicotrópicas.
Por conseguinte, conforme estabelece o Ministério da Saúde, tal substância é considerada tóxica exatamente pela sua nocividade individual e social capaz de gerar dependência física ou psíquica.
Nesse ponto, valho-me dos ensinamentos do eminente Ministro Felix Fisher, que em seu substancioso voto vencedor, proferido nos autos do HC 7511/SP, DJU de 9-11-98, p.122, STJ, dispôs: ... Penso que o cloreto de etila continua sendo proibido para efeitos, inclusive, penais, porque, se entendermos que esta substância estaria tão-somente proscrita e não proibida pela Lei de Tóxicos, teríamos que admitir também que a cocaína, a maconha e a heroína estariam liberadas no plano da repressão aos entorpecentes e substâncias de efeitos análogos.
Ademais, o delito de contrabando (art. 334, do CP), norma geral que é, refere-se a mercadoria proibida, fica afastado, na hipótese, pela norma especial definida na Lei 6.368/76, já que expressamente previsto o cloreto de etila como substância entorpecente (Portaria nº 344/98).
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