Uso, abuso e dependência de cocaína
Rompimento do palato pelo uso de cocaína |
Nem todos os usuários de cocaína tornam-se dependentes da droga. Da mesma forma, nenhum dependente de cocaína, ao iniciar o consumo, tinha a intenção de se tornar dependente da substância. No entanto, não existe um limite nítido entre o início do consumo, o uso continuado e o desenvolvimento dos transtornos decorrentes do uso da droga (principalmente Abuso e Síndrome de Dependência). A experimentação da cocaína se desenvolve sempre em um meio (contexto) social definido, promovendo efeitos estimulantes e euforia pronunciada. Nenhuma das conseqüências negativas do consumo está presente (nos primeiros meses de consumo ocasional), parecendo ao usuário iniciante que os avisos e informações que tinha sobre a droga antes da primeira experiência, eram exagerados ou simples "propaganda enganosa". Em busca dos efeitos inicias, o consumo da cocaína continua; o sujeito passa a visitar outros usuários com mais freqüência, dando-se a desculpa que "estes são verdadeiros amigos" por compartilharem sensações e prazeres semelhantes, diferentes dos amigos "caretas" de antigamente.
Pela primeira vez acontece a compra da cocaína de um destes amigos e o consumo se intensifica. Até este momento poucos efeitos negativos são evidentes. A família nota alguma mudança, mas como o indivíduo mantém (quase) todas as suas atividades anteriores (trabalho, estudo, pernoitar em casa, etc.), a desconfiança muitas vezes não é revelada ao usuário; este se sente ainda mais confiante, também pelas próprias características da droga. Mais um período de consumo e entra em contato com fornecedores de quantidades maiores, traficantes ou "aviões" (outros usuários que mantém seu consumo por meio de comércio de pequenas quantidades da droga). Descobre, então que quando adquire maior quantidade ocorre um barateamento de seu consumo; compra grande quantidade "para usar ao longo do mês"; infalivelmente consumindo em período muito menor. Algumas conseqüências negativas já são evidentes, mas sua importância é muito menor do que o prazer obtido pelo consumo da substância. "Perco de um lado, mas ganho de outro", pensa o usuário, já atrelado ao caminho determinado pela droga. Podem começar a ocorrer episódios de consumo de grandes quantidades durante várias horas ou poucos dias, as orgias de consumo ("binges" em inglês). Neste ponto suas atividades e atribuições anteriores ao consumo já sofrem de negligência importante, contribuindo ainda mais para o retorno ao consumo.A situação tem a gravidade intensificada e o usuário muito se assemelha ao camundongo de laboratório que fornece aos pesquisadores inúmeras informações sobre as drogas de abuso, passando a consumir compulsivamente a despeito das evidências claras de prejuízos sobre sua vida e daqueles que o cercam. Neste ponto qualquer pessoa identifica o dependente de cocaína. O tratamento tem como objetivo interromper o consumo, restaurar suas conseqüências e mudar o estilo de vida do indivíduo, que facilita o retorno ao uso.O fator mais relevante deste pequeno exemplo, de um dos padrões de consumo que evolui para a Síndrome de Dependência, é que o indivíduo não necessita chegar a este estado terminal para ser considerado dependente. Qualquer pessoa (não dependente) concorda que muito antes disto, o indivíduo perdeu a sua capacidade de controlar o consumo de cocaína. A perda deste controle parece ser o fato central do estabelecimento do estado de dependência; a cocaína passa a controlar o indivíduo, e não o contrário, que ocorreu no momento da experimentação inicial.Quanto mais cedo se detecta a dependência maior o sucesso que intervenções terapêuticas podem obter. Com este último conceito como foco tanto a Organização Mundial de Saúde (OMS), como a Associação Psiquiátrica Norte-americana (APA), estabelecem critérios que direcionam o diagnóstico da Síndrome da Dependência, com o intuito de diagnosticar precocemente este Transtorno com enorme custo social.
Pela primeira vez acontece a compra da cocaína de um destes amigos e o consumo se intensifica. Até este momento poucos efeitos negativos são evidentes. A família nota alguma mudança, mas como o indivíduo mantém (quase) todas as suas atividades anteriores (trabalho, estudo, pernoitar em casa, etc.), a desconfiança muitas vezes não é revelada ao usuário; este se sente ainda mais confiante, também pelas próprias características da droga. Mais um período de consumo e entra em contato com fornecedores de quantidades maiores, traficantes ou "aviões" (outros usuários que mantém seu consumo por meio de comércio de pequenas quantidades da droga). Descobre, então que quando adquire maior quantidade ocorre um barateamento de seu consumo; compra grande quantidade "para usar ao longo do mês"; infalivelmente consumindo em período muito menor. Algumas conseqüências negativas já são evidentes, mas sua importância é muito menor do que o prazer obtido pelo consumo da substância. "Perco de um lado, mas ganho de outro", pensa o usuário, já atrelado ao caminho determinado pela droga. Podem começar a ocorrer episódios de consumo de grandes quantidades durante várias horas ou poucos dias, as orgias de consumo ("binges" em inglês). Neste ponto suas atividades e atribuições anteriores ao consumo já sofrem de negligência importante, contribuindo ainda mais para o retorno ao consumo.A situação tem a gravidade intensificada e o usuário muito se assemelha ao camundongo de laboratório que fornece aos pesquisadores inúmeras informações sobre as drogas de abuso, passando a consumir compulsivamente a despeito das evidências claras de prejuízos sobre sua vida e daqueles que o cercam. Neste ponto qualquer pessoa identifica o dependente de cocaína. O tratamento tem como objetivo interromper o consumo, restaurar suas conseqüências e mudar o estilo de vida do indivíduo, que facilita o retorno ao uso.O fator mais relevante deste pequeno exemplo, de um dos padrões de consumo que evolui para a Síndrome de Dependência, é que o indivíduo não necessita chegar a este estado terminal para ser considerado dependente. Qualquer pessoa (não dependente) concorda que muito antes disto, o indivíduo perdeu a sua capacidade de controlar o consumo de cocaína. A perda deste controle parece ser o fato central do estabelecimento do estado de dependência; a cocaína passa a controlar o indivíduo, e não o contrário, que ocorreu no momento da experimentação inicial.Quanto mais cedo se detecta a dependência maior o sucesso que intervenções terapêuticas podem obter. Com este último conceito como foco tanto a Organização Mundial de Saúde (OMS), como a Associação Psiquiátrica Norte-americana (APA), estabelecem critérios que direcionam o diagnóstico da Síndrome da Dependência, com o intuito de diagnosticar precocemente este Transtorno com enorme custo social.
Conforme descrito acima, a Dependência é uma Síndrome, cujos sintomas se manifestam em áreas de funcionamento social, psicológica e biológica do indivíduo e estes critérios privilegiam estas áreas de impacto.
Síndrome de Dependência – diretrizes diagnósticas
Um diagnóstico definitivo de dependência deve usualmente ser feito somente se três ou mais dos seguintes requisitos tenham sido experienciados ou exibidos em algum momento durante o ano anterior:
(OMS, 1993)
O Abuso da cocaína é um transtorno com diagnóstico de exclusão, ou seja, só pode ser diagnosticado quando a dependência não se encontra presente. Este diagnóstico, descrito pela APA (Associação Psiquiátrica Norte-americana), focaliza fundamentalmente o consumo problemático e recorrente da cocaína, ou seja, o indivíduo que passa a ter comprometimentos sociais, médicos, psicológicos ou legais e mesmo assim mantém seu uso por período mínimo de um ano (12 meses), mesmo não sendo dependente (por não apresentar os sintomas descritos para a dependência da cocaína, descritos acima). Esta pessoa geralmente tem um menor impacto da droga sobre sua vida (representado por conseqüências geralmente mais brandas do que na dependência), porém caso não seja submetido ao mesmo tratamento que o dependente terá (quase que) infalivelmente o destino da Síndrome de Dependência. Por ter, teoricamente, menores conseqüências negativas, pode-se considerar o Abuso de cocaína como um transtorno que tem a possibilidade de obtenção de melhores resultados terapêuticos do que a Dependência.
- Forte desejo ou compulsão para consumir a substância;
- Dificuldade para controlar o comportamento de consumir a substância, em termos de seu início, término ou níveis de consumo;
- Estado de Abstinência fisiológico quando o consumo da substância cessou ou foi reduzido, como evidenciado por:
- Sintomas característicos para a abstinência da substância
- Retorno ao uso da substância (ou similar) para alívio ou evitação destes sintomas
- Evidência de Tolerância, de tal forma que doses crescentes da substância são requeridas para alcançar efeitos originalmente produzidos por doses mais baixas. Se o indivíduo mantém a dose estável, outra forma de verificar a presença deste critério é a redução dos efeitos da substância;
- Abandono progressivo de prazeres ou interesses alternativos em favor do uso da substância, aumento da quantidade de tempo necessário para obter ou tomar a substância ou ainda para se recuperar de seus efeitos
- Persistência no uso da substância, a despeito de evidências claras de conseqüências manifestamente nocivas.
(OMS, 1993)
O Abuso da cocaína é um transtorno com diagnóstico de exclusão, ou seja, só pode ser diagnosticado quando a dependência não se encontra presente. Este diagnóstico, descrito pela APA (Associação Psiquiátrica Norte-americana), focaliza fundamentalmente o consumo problemático e recorrente da cocaína, ou seja, o indivíduo que passa a ter comprometimentos sociais, médicos, psicológicos ou legais e mesmo assim mantém seu uso por período mínimo de um ano (12 meses), mesmo não sendo dependente (por não apresentar os sintomas descritos para a dependência da cocaína, descritos acima). Esta pessoa geralmente tem um menor impacto da droga sobre sua vida (representado por conseqüências geralmente mais brandas do que na dependência), porém caso não seja submetido ao mesmo tratamento que o dependente terá (quase que) infalivelmente o destino da Síndrome de Dependência. Por ter, teoricamente, menores conseqüências negativas, pode-se considerar o Abuso de cocaína como um transtorno que tem a possibilidade de obtenção de melhores resultados terapêuticos do que a Dependência.
Formas de consumo da cocaína
Embora o termo "Crack" venha sendo veiculado há pouco mais de 15 anos, a história do consumo dos produtos da cocaína é bastante antiga. Relatos sobre o uso das folhas do Arbusto Erythroxylon, natural da América do Sul, mais especificamente encontrado na região Amazônica, são encontrados em tribos peruanas 2000 anos antes do descobrimento de nosso continente. A folha mascada libera baixas doses de cocaína, substância ativa da planta, que promove todos os seus efeitos. O uso, porém, era controlado, associado exclusivamente aos propósitos religiosos, ocupacionais ou como prerrogativa da mais alta casta deste povo. Esta forma de uso se manteve até a civilização Inca, mesmo quando da chegada dos espanhóis, que logo verificaram suas propriedades de estímulo na exploração do ouro da Terra Nova. Contudo a tentativa de transporte da planta para a Europa, naquela época, destruía a substância ativa contida nas folhas, perdendo todos os seus efeitos estimulantes. Esta razão foi responsável pelo esquecimento da substância nas publicações européias dos séculos seguintes, até que na metade do século passado foi conseguida a extração da substância pura, a cocaína, em forma de pó.
A apresentação aspirada produzia um efeito muito maior do que o observado na mascagem das folhas, tornando-se coqueluche no final do século passado no Velho Continente – a primeira epidemia de consumo da coca. Ao mesmo tempo a medicina inventava um método novíssimo para administração de remédios, a injeção. Assim, as principais formas de consumo na virada do século eram intranasal e intravenosa. Em seguida, porém, a sociedade foi obrigada a se confrontar com um imenso rol de complicações e conseqüências desastrosas do consumo de cocaína e em 1914 a cocaína passava a ser proibida tanto nas Américas como na Europa. A sociedade moderna tomava consciência, pela primeira vez, do potencial destrutivo desta droga.
A apresentação aspirada produzia um efeito muito maior do que o observado na mascagem das folhas, tornando-se coqueluche no final do século passado no Velho Continente – a primeira epidemia de consumo da coca. Ao mesmo tempo a medicina inventava um método novíssimo para administração de remédios, a injeção. Assim, as principais formas de consumo na virada do século eram intranasal e intravenosa. Em seguida, porém, a sociedade foi obrigada a se confrontar com um imenso rol de complicações e conseqüências desastrosas do consumo de cocaína e em 1914 a cocaína passava a ser proibida tanto nas Américas como na Europa. A sociedade moderna tomava consciência, pela primeira vez, do potencial destrutivo desta droga.
De uma forma extremamente interessante, a proibição surtiu efeitos importantes e o uso da cocaína praticamente desapareceu por pouco mais de meio século. A cocaína ressurge no início da década de 1970 e surpreendentemente, ganha a reputação de droga segura e "light", a "vitamina dos anos 90". O resultado disto foi a explosão do consumo na América do norte, atingindo seu pico em 1985 nos Estados Unidos da América e cinco anos mais tarde em nosso país. O Brasil passa a ser reconhecido como uma das principais vias de exportação da droga, principalmente para a Europa.
Em meados da década passada a sociedade teve contato com o "crack". Denominado de "pedra" pelos usuários em nosso meio, é consumido por "via" fumada. A pedra unitária tem preço mais acessível, promovendo a impressão que o usuário economiza quando troca o consumo do pó pela pedra. Grande ilusão: a "pedra" tem quantidade mínima de substância ativa, muito menor do que o pó; seus efeitos, porém são mais pronunciados pela liberação da cocaína diretamente na corrente sangüínea através dos pulmões. Reputado como "uma nova droga" o crack não passa de um novo método de consumo de uma droga muito antiga. Próximo às áreas de produção, entretanto, uma outra forma de fumar a cocaína, há muito era utilizada: a pasta-base. Esta é uma mistura das folhas com solventes químicos, que apresenta enorme toxicidade (40% de impurezas). Uma outra forma de fumar a cocaína é conhecida em várias regiões do Brasil com o nome de Méla ou Merla. Esta é mais tóxica ainda que a pasta base, sendo que as complicações médicas são ainda mais precoces no curso do uso da cocaína. Outra forma ainda que o organismo absorve a cocaína é através de mucosas. As complicações médicas deste consumo são imprevisíveis e freqüentemente letais.
No processo de produção da droga, éter, acetona, querosene, ácido sulfúrico, ácido clorídrico, amoníaco são usados, contribuindo para a toxicidade da droga. Outras substâncias igualmente tóxicas (gasolina, talco, etc.) freqüentemente são acrescidas à cocaína já produzida, com a finalidade de aumentar o lucro do tráfico. Mudam os processos de produção, as vias de utilização e os produtos finais, porém em comum a todas encontramos a mesma substância ativa: a cocaína.
Também em comum às diversas formas de consumo temos a Dependência, o uso compulsivo, as complicações em várias áreas de funcionamento do consumidor (família, saúde, ocupação, entre outras), o imenso custo social e de saúde (estimado em até 300 bilhões de dólares norte-americanos por ano, apenas nos EUA), a criminalidade e enfim, a morte.
Utilizaremos, nesta publicação o termo cocaína abrangendo todas as formas de consumo citadas acima, não exclusivamente ao consumo do pó. Vale ressaltar que muitos usuários relatam mais de uma via de administração da droga, freqüentemente citada como: "a que estiver disponível, consumimos". Acrescentaremos, sempre que necessário, as características que diferem as formas nos tópicos abordados.
Quais os efeitos imediatos (agudos) do uso da cocaína? O consumo intranasal de cocaína produz seus efeitos entre 1 e 2 minutos após o uso, tendo duração de 30 minutos, em média. Tanto o uso endovenoso como o fumado, produzem efeitos quase imediatos, porém estes se dissipam mais rapidamente (até 10 minutos), muitas vezes obrigando o indivíduo a voltar a utilizar a droga após 5 minutos. Os metabólitos (produtos ou "restos" do uso da substância ativa) podem ser detectados alguns minutos após poucas aspirações (ou injeção), permanecendo por até três dias.
Quais os efeitos imediatos (agudos) do uso da cocaína? O consumo intranasal de cocaína produz seus efeitos entre 1 e 2 minutos após o uso, tendo duração de 30 minutos, em média. Tanto o uso endovenoso como o fumado, produzem efeitos quase imediatos, porém estes se dissipam mais rapidamente (até 10 minutos), muitas vezes obrigando o indivíduo a voltar a utilizar a droga após 5 minutos. Os metabólitos (produtos ou "restos" do uso da substância ativa) podem ser detectados alguns minutos após poucas aspirações (ou injeção), permanecendo por até três dias.
A euforia se transforma rapidamente em depressão e irritabilidade, aumentando a necessidade de voltar a acender o cachimbo ou "esticar" mais uma fileira. O sujeito passa a ter uma autoconfiança irreal, podendo ainda apresentar alucinações (auditivas e visuais) e delírios de perseguição, indistinguíveis da patologia psiquiátrica (ex. Esquizofrenia). Sintomas físicos do consumo são observados: aumento da pressão arterial, aumento da freqüência dos batimentos cardíacos, constrição dos vasos sangüíneos (desaparecimento de veias), aumento da temperatura corpórea, liberação de açúcar no sangue, e aumento da força da contração do músculo cardíaco. A droga tem a capacidade de promover anestesia local, fato que motivou sua utilização médica no século XIX. A cocaína possibilitou, de fato, a primeira cirurgia oftálmica – como conseqüência indireta deste fato, o primeiro oftalmologista a realizar esta cirurgia tornou-se dependente da droga, interrompendo precocemente sua carreira profissional. Devido aos riscos da droga e ao desenvolvimento de outros anestésicos seguros, tal utilização foi completamente banida da Medicina até 1914. Quando os efeitos da droga dissipam, o usuário conta que apresenta sintomas contrários (depressão, angústia, etc.) , levando-o ao desespero por uma nova dose ("fissura" – característica mais proeminente de todas as formas de consumo da cocaína).
Quais as conseqüências do uso continuado (crônico) da cocaína?
Se os efeitos agudos da cocaína já são perigosos, os efeitos e conseqüências do uso continuado são letais. Suas conseqüências são quase sempre desastrosas sobre a vida do usuário, promovendo prejuízos em suas mais diversas áreas de funcionamento. Depressão intensa com risco de suicídio, desmotivação, sonolência, irritabilidade crônica, episódios paroxísticos de ansiedade (ataques de pânico) e finalmente psicose paranóide (O indivíduo tem certeza que está sendo perseguido, mesmo confrontado com a inexistência de indícios reais) são os efeitos psíquicos mais observados na utilização crônica da droga. As complicações médicas são destacadas no próximo capítulo. Se antes do uso o indivíduo já apresentar sintomas depressivos, estes se tornam mais severos ainda, resultando ocasionalmente em tentativas de suicídio.
Separação conjugal, abandono de atividades ocupacionais (ex. perda de emprego), incapacidade de cumprimento de obrigações sociais, dependência financeira ou engajamento em atividades criminais são descritos por muitos usuários "crônicos".
Aos efeitos crônicos associam-se os efeitos potencialmente letais da droga. O uso de cocaína é a principal causa de infarto agudo de miocárdio em jovens (até 40 anos) nos EUA. A cocaína altera o ritmo elétrico cardíaco, produzindo arritmias, que podem ser visualizadas no eletrocardiograma. O aumento da pressão arterial descrito no capítulo anterior contribui para a ocorrência de hemorragias (sangramentos) em diversas partes do corpo, inclusive no cérebro, possibilitando a ocorrência de acidentes vasculares cerebrais (conhecidos como "derrame"). O aumento de temperatura corpórea pode atingir mais de 42º, provocando a morte por hipertermia. Doses maiores estão relacionadas com parada respiratória.
Aos efeitos crônicos associam-se os efeitos potencialmente letais da droga. O uso de cocaína é a principal causa de infarto agudo de miocárdio em jovens (até 40 anos) nos EUA. A cocaína altera o ritmo elétrico cardíaco, produzindo arritmias, que podem ser visualizadas no eletrocardiograma. O aumento da pressão arterial descrito no capítulo anterior contribui para a ocorrência de hemorragias (sangramentos) em diversas partes do corpo, inclusive no cérebro, possibilitando a ocorrência de acidentes vasculares cerebrais (conhecidos como "derrame"). O aumento de temperatura corpórea pode atingir mais de 42º, provocando a morte por hipertermia. Doses maiores estão relacionadas com parada respiratória.
Uma das conseqüências mais importantes do consumo da cocaína é o surgimento de convulsões. A cocaína é um potente facilitador da ocorrência de convulsões de todos os tipos, principalmente tônico-clônicas (indistinguíveis daquelas da epilepsia). Em animais de laboratório (geralmente ratos e macacos) "tratados" com cocaína, observamos mortes por convulsões (acompanhados de inanição e exaustão) após 17 dias de consumo da droga. Imagina-se que caso o ser humano tivesse acesso irrestrito à droga, o resultado seria muito semelhante.
Complicações médicas do consumo de cocaína e crack
Podemos dividir as complicações associadas à droga em:
Complicações médicas do consumo de cocaína:
Complicações médicas do consumo de cocaína:
- Decorrentes dos efeitos próprios da droga: complicações médicas e psiquiátricas
- Decorrentes das substâncias adicionadas à cocaína (adulterantes)
- Decorrentes da via de consumo utilizada
- Decorrentes do estilo de vida do usuário de cocaína
As conseqüências médicas do consumo vão desde um ligeiro sangramento nasal após um uso isolado, até comprometimentos irrecuperáveis e morte, como enfatizado no capítulo anterior. Alguns dos mais dramáticos comprometimentos da cocaína ocorrem sobre o Sistema Cárdio-respiratório. Angina de peito, infarto agudo do miocárdio e aumento do volume cardíaco são os efeitos mais proeminentes observados sobre o coração. Usuários crônicos apresentam capacidade respiratória reduzida e maior dificuldade de transporte de oxigênio. Um quadro agudo relatado por usuários por via fumada é conhecido como "Pulmão de crack": dor intensa no peito, falta de ar e tosse sanguinolenta. Freqüentemente o indivíduo se queixa de impotência sexual, incapacidade de ejaculação ou de obter o orgasmo. Diminuição do desejo sexual é observada em usuários crônicos de ambos os sexos. Tentativas de suicídio são comuns entre usuários de grandes doses. As oscilações entre a euforia produzida pelos efeitos da droga e a depressão posterior estão relacionadas às tentativas, bem como o próprio estilo de vida do indivíduo.
As complicações pela via de consumo ocorrem em conjunto com as complicações pela via de consumo preferencial. As mais comuns são infecções de pele (injeções contaminadas), infecção na válvula cardíaca, AIDS e Hepatite. A pele infectada se apresenta inchada, dolorida, avermelhada e quente; quando presentes febre e calafrios podem ser indicativo que a infecção atingiu o sangue e/ou outros órgãos (Sepsis). Esta é uma conseqüência letal se o indivíduo não se apresentar para tratamento imediato. O uso por via intravenosa transmite infecções de um usuário para outro, sendo as mais dramáticas a Hepatite por vírus e a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS).
Endocardite bacteriana é a denominação médica para a infecção sobre as válvulas cardíacas. Bactérias encontradas na própria pele do usuário ou na água utilizada para diluir a droga, são injetadas conjuntamente à coca e encontram dentro do coração um local seguro para se instalar e reproduzir. As válvulas cardíacas passam a ter funcionamento prejudicado, com dificuldades para deixar passar o fluxo de sangue ou ainda não conseguindo evitar que o sangue bombeado pelo coração reflua. Ao exame físico são ouvidos sopros cardíacos e a ultra-sonografia (Ecocardiografia) comprova o diagnóstico. A condição deve ser prescrita com antibióticos por períodos longos, e mesmo quando tratada adequadamente pode necessitar cirurgia cardíaca para reposição da válvula acometida.
O estilo de vida do usuário crônico predispõe a complicações de outra ordem. É mais comum que o usuário crônico de cocaína também utilize álcool e outras drogas, podendo desenvolver dependência a estas. Dependência de mais de uma substância representa potencialização dos efeitos danosos de cada uma. O usuário crônico usualmente se engaja em atividades ilícitas (criminais) para obtenção da droga e manutenção do consumo. O envolvimento criminal, por sua vez, resulta muitas vezes em acidentes e homicídios, que podem ser considerados também como complicações médicas do consumo da droga, além de suicídio, citado anteriormente.
O estilo de vida do usuário crônico predispõe a complicações de outra ordem. É mais comum que o usuário crônico de cocaína também utilize álcool e outras drogas, podendo desenvolver dependência a estas. Dependência de mais de uma substância representa potencialização dos efeitos danosos de cada uma. O usuário crônico usualmente se engaja em atividades ilícitas (criminais) para obtenção da droga e manutenção do consumo. O envolvimento criminal, por sua vez, resulta muitas vezes em acidentes e homicídios, que podem ser considerados também como complicações médicas do consumo da droga, além de suicídio, citado anteriormente.
Cocaína e mulheres
Até pouco tempo atrás, pensava-se que todos os dependentes eram iguais e assim formariam um grupo homogêneo. Somente nos últimos 25 anos os serviços de tratamento perceberam a necessidade de identificar subgrupos de dependentes, com a finalidade de ajustar as propostas terapêuticas para cada subgrupo.
Com o aumento da procura de tratamento por pacientes do sexo feminino foram verificadas características diferenciais, próprias desta população. O consumo de álcool e drogas em mulheres carrega um estigma social e moral mais intenso, as mulheres costumam procurar tratamentos médicos clínicos gerais ao invés de serviços especializados em tratamento de dependência química, suas razões para início e manutenção do consumo são diferentes (p.ex. os homens costumam consumir com amigos e a mulher, sozinha), bem como o impacto das drogas sobre sua saúde.
Também é mais freqüente encontrarmos co-morbidade psiquiátrica (associação de transtornos psiquiátricos, principalmente Depressão, com Abuso e Síndrome de Dependência) em mulheres do que na população dependente masculina, demandando tratamento associado de ambos os quadros clínicos. O organismo da mulher parece mais frágil ao impacto da cocaína, com maiores alterações hormonais, que acarretam desde produção de leite até ausência dos ciclos menstruais.
Também é mais freqüente encontrarmos co-morbidade psiquiátrica (associação de transtornos psiquiátricos, principalmente Depressão, com Abuso e Síndrome de Dependência) em mulheres do que na população dependente masculina, demandando tratamento associado de ambos os quadros clínicos. O organismo da mulher parece mais frágil ao impacto da cocaína, com maiores alterações hormonais, que acarretam desde produção de leite até ausência dos ciclos menstruais.
As complicações clínicas costumam ser também precoces, sendo de fundamental importância (e gravidade) a associação de gravidez com o consumo de cocaína. A cocaína atravessa rapidamente a placenta, exercendo todos os seus efeitos físicos sobre o feto (hipertensão, constrição de vasos sangüíneos), levando à falta de oxigenação e suprimento de sangue adequado. Recém-nascidos de gestantes consumidoras apresentam diversas complicações que incluem baixo peso ao nascimento, morte logo após o parto, malformações (genitais, urinárias, redução do tamanho do cérebro, entre outras), hemorragia cerebral, alterações de padrão de sono, diminuição de alimentação, aumento de reflexos e disfunções musculares. Estas últimas podem durar até 2,5 meses após o parto. Uma parcela das mulheres dependentes de cocaína se engaja em prostituição como forma de obtenção de droga. O inverso também parece ser verdadeiro, havendo uma alta prevalência de prostitutas que consomem cocaína, álcool e outras drogas. Problemas relacionados à impulsividade, dificuldades interpessoais e dificuldade no julgamento foram associadas às dependentes de cocaína. Porém não se conseguiu definir se estas características eram anteriores ou conseqüências do consumo da droga.
Algumas considerações adicionais, relativas ao tratamento de mulheres dependentes, devem ser enfatizadas, com a finalidade de possibilitar melhores resultados terapêuticos:
Prover possibilidade de cuidados para os filhos, no mínimo durante os momentos que a paciente se encontra em contato com o serviço de tratamento.
Identificar rapidamente padrões de consumo compulsivo (ou Abuso/Dependência) de medicações prescritas, que dificultam o engajamento da paciente no processo de recuperação e mudança do estilo de vida (por exemplo, "calmantes").
Treinamento intensivo de auto-estima, geralmente mais abalada do que na população dependente do sexo masculino.
Modelagem dos papéis sociais da mulher (por exemplo, familiar e ocupacional).
Cocaína e crack entre adolescentes
O período que abrange o final da adolescência até o início da idade adulta é a fase da vida em que existe maior risco para o início do uso de cocaína. A adolescência é considerada uma fase crítica da vida do indivíduo, onde ocorrem diversas modificações internas (características da personalidade) e externas, como por exemplo, o surgimento de caracteres sexuais secundários. O indivíduo se afasta dos pais e aproxima-se de colegas e amigos, fazendo uso da "liberdade" conquistada (de forma gradativa ou abrupta). Esta fase também é reconhecida como tendo um grande componente de ansiedade e estresse. O adolescente apresenta também uma tendência natural para o envolvimento em situações de risco. A dificuldade na previsão de conseqüências no futuro (prospecção) faz que o indivíduo jovem viva exclusivamente o "aqui e agora". Estes fatores parecem contribuir para a experimentação de álcool e drogas, particularmente a cocaína em nosso meio.
O indivíduo jovem busca, então, ser admitido em um grupo social de "iguais", o que inclui a aquisição dos comportamentos deste grupo, e a experimentação de álcool e drogas geralmente consiste em um dos principais comportamentos. A cocaína ocupa a 8ª posição entre as drogas de abuso no Brasil, tendo seu consumo quadruplicado nesta população entre 1987 e 1997 (0,5% para 2% entre estudantes de 1º e 2º graus). O mesmo levantamento aponta o crescimento do consumo ao longo da vida, bem como o aumento de usuários "pesados" nesta população em 8 entre 10 capitais pesquisadas, sendo que as taxas de uso freqüente aumentaram em 6 cidades pesquisadas. Entre 1993 e 1997 o crescimento do uso durante algum momento na vida do estudante de primeiro e segundo grau foi da ordem de 80%, indicando a importância do problema do consumo dessa droga entre adolescentes (Galduróz, J.C.F.; Noto, A.R.; Carlini, E.A.).
O indivíduo jovem busca, então, ser admitido em um grupo social de "iguais", o que inclui a aquisição dos comportamentos deste grupo, e a experimentação de álcool e drogas geralmente consiste em um dos principais comportamentos. A cocaína ocupa a 8ª posição entre as drogas de abuso no Brasil, tendo seu consumo quadruplicado nesta população entre 1987 e 1997 (0,5% para 2% entre estudantes de 1º e 2º graus). O mesmo levantamento aponta o crescimento do consumo ao longo da vida, bem como o aumento de usuários "pesados" nesta população em 8 entre 10 capitais pesquisadas, sendo que as taxas de uso freqüente aumentaram em 6 cidades pesquisadas. Entre 1993 e 1997 o crescimento do uso durante algum momento na vida do estudante de primeiro e segundo grau foi da ordem de 80%, indicando a importância do problema do consumo dessa droga entre adolescentes (Galduróz, J.C.F.; Noto, A.R.; Carlini, E.A.).
A adolescência é considerada como um período crítico para o surgimento de complicações pelo consumo de substâncias psicoativas. Adolescentes tem progressão mais rápida do consumo e de seus resultados danosos. Os prejuízos que o consumo acarreta levam a conseqüências de difícil reversão: interrupção do desenvolvimento da personalidade, resultando em deficiências futuras do funcionamento do indivíduo. O consumo afeta ainda o desenvolvimento das funções sociais do sujeito, bem como o estabelecimento de relações interpessoais (p.ex. afetivas). Este quadro apresentado acima torna o consumo de álcool e drogas nesta população um problema ainda mais catastrófico do que o observado em indivíduos na fase adulta. O tratamento, portanto, deve ter início o quanto antes.
O tratamento deve ter a orientação para a abstinência total e de todas as drogas (e álcool), da mesma forma que deve ocorrer na população adulta. Porém esta tarefa é muito mais difícil para o adolescente, pelo fato do adolescente não dispor, ainda, de um sistema de suporte social (trabalho, relações afetivas, etc.). A família constitui a única exceção. Outro problema adicional para os adolescentes é representado pelo modelo assistencial, que vem sendo desenvolvido neste século voltado à população adulta. Isto resulta em dificuldades intrínsecas para a obtenção de sucesso terapêutico. Adolescentes dependentes têm, por exemplo, poucas (ou nenhuma) atividades alternativas ao consumo de álcool e drogas, e inúmeras vezes só tem relacionamentos com outros usuários, traficantes e dependentes. Piorando ainda mais a situação, o engajamento em micro-tráfico ("avião") é uma das maneiras freqüentes de obtenção da droga.
Os objetivos terapêuticos do tratamento da população de adultos jovens devem incluir proposta de mudança global do funcionamento do indivíduo e de seu estilo de vida, desenvolvimento de valores "saudáveis", atitudes e comportamentos que propiciem a interação social positiva e esforço para a reabilitação ocupacional (escola, preparação vocacional, etc.), de forma ainda mais intensiva que para a população adulta.
Muitos usuários começam a utilizar cocaína durante o período acadêmico, e uma parcela deste grupo passa a consumir a droga também em outras situações, mantendo e agravando o consumo da cocaína, propiciando as condições ideais para o desenvolvimento da Dependência. Um corolário dos aspectos apresentados neste capítulo é o uso de drogas entre estudantes universitários, que se encontram na fase de vida imediatamente posterior à adolescência. Este aspecto é de extrema importância, uma vez que os universitários irão a futuro breve, constituir a massa crítica da nação. Em nosso país a situação também merece cuidados especiais; estudo realizado na Universidade de São Paulo detectou taxas de até 8% de consumo de cocaína na população estudante (Andrade, A.G.; Queiroz, S.; Villaboim, R.M.C.).
A melhor abordagem do problema, apresentando também a melhor relação custo-benefício possível é a prevenção ao abuso de drogas. Prevenir significa desenvolver programas junto às comunidades (em geral), pesquisando as características próprias cada uma delas e, de acordo com suas particularidades, elaborar estratégias para evitar tanto o início do consumo como o caminho rumo aos transtornos decorrentes das substâncias psicoativas (abuso e dependência), incluindo da cocaína. Estes programas há muito já se fazem necessários para a efetiva abordagem do problema do consumo de drogas entre adolescentes.
Cocaína e a família
Familiares compartilham genes que podem contribuir para o abuso de drogas. Isto é verificado na dependência do álcool, quando se observa que gêmeos separados ao nascimento têm grande concordância no diagnóstico de Dependência de álcool quando atingem a adolescência ou a idade adulta. Por outro lado, familiares também compartilham o mesmo meio ambiente, cultura e eventos vitais, havendo a possibilidade da aprendizagem de comportamentos, inclusive de consumo de álcool e drogas.
O tratamento deve ter a orientação para a abstinência total e de todas as drogas (e álcool), da mesma forma que deve ocorrer na população adulta. Porém esta tarefa é muito mais difícil para o adolescente, pelo fato do adolescente não dispor, ainda, de um sistema de suporte social (trabalho, relações afetivas, etc.). A família constitui a única exceção. Outro problema adicional para os adolescentes é representado pelo modelo assistencial, que vem sendo desenvolvido neste século voltado à população adulta. Isto resulta em dificuldades intrínsecas para a obtenção de sucesso terapêutico. Adolescentes dependentes têm, por exemplo, poucas (ou nenhuma) atividades alternativas ao consumo de álcool e drogas, e inúmeras vezes só tem relacionamentos com outros usuários, traficantes e dependentes. Piorando ainda mais a situação, o engajamento em micro-tráfico ("avião") é uma das maneiras freqüentes de obtenção da droga.
Os objetivos terapêuticos do tratamento da população de adultos jovens devem incluir proposta de mudança global do funcionamento do indivíduo e de seu estilo de vida, desenvolvimento de valores "saudáveis", atitudes e comportamentos que propiciem a interação social positiva e esforço para a reabilitação ocupacional (escola, preparação vocacional, etc.), de forma ainda mais intensiva que para a população adulta.
Muitos usuários começam a utilizar cocaína durante o período acadêmico, e uma parcela deste grupo passa a consumir a droga também em outras situações, mantendo e agravando o consumo da cocaína, propiciando as condições ideais para o desenvolvimento da Dependência. Um corolário dos aspectos apresentados neste capítulo é o uso de drogas entre estudantes universitários, que se encontram na fase de vida imediatamente posterior à adolescência. Este aspecto é de extrema importância, uma vez que os universitários irão a futuro breve, constituir a massa crítica da nação. Em nosso país a situação também merece cuidados especiais; estudo realizado na Universidade de São Paulo detectou taxas de até 8% de consumo de cocaína na população estudante (Andrade, A.G.; Queiroz, S.; Villaboim, R.M.C.).
A melhor abordagem do problema, apresentando também a melhor relação custo-benefício possível é a prevenção ao abuso de drogas. Prevenir significa desenvolver programas junto às comunidades (em geral), pesquisando as características próprias cada uma delas e, de acordo com suas particularidades, elaborar estratégias para evitar tanto o início do consumo como o caminho rumo aos transtornos decorrentes das substâncias psicoativas (abuso e dependência), incluindo da cocaína. Estes programas há muito já se fazem necessários para a efetiva abordagem do problema do consumo de drogas entre adolescentes.
Cocaína e a família
Familiares compartilham genes que podem contribuir para o abuso de drogas. Isto é verificado na dependência do álcool, quando se observa que gêmeos separados ao nascimento têm grande concordância no diagnóstico de Dependência de álcool quando atingem a adolescência ou a idade adulta. Por outro lado, familiares também compartilham o mesmo meio ambiente, cultura e eventos vitais, havendo a possibilidade da aprendizagem de comportamentos, inclusive de consumo de álcool e drogas.
A Dependência de substâncias psicoativas é definida como um transtorno individual. Muitos especialistas aceitam, porém, o conceito da dependência como doença familiar, por atingir diretamente não só o usuário, mas aqueles que o cercam. As reações familiares à dependência na família abrangem um enorme leque que vai desde a expulsão de casa até a aceitação do consumo dentro do ambiente familiar. Costumamos denominar este último de "FACILITAÇÃO" (favorecimento de comportamentos e atitudes relativos ao consumo de drogas), que sempre acarreta conseqüências desastrosas. Embora compreensível, aceitar que o familiar utilize qualquer tipo de drogas dentro de casa (geralmente para evitar as complicações legais) estimula os múltiplos comportamentos relacionados à intensificação do consumo, aceleração do desenvolvimento da dependência, dificuldade de trazer o indivíduo para o tratamento e ocorrência de complicações precoces (médicas, psicológicas e sociais). Entre os principais exemplos de facilitação encontram-se a liberdade excessiva, a preocupação em ocultar as falhas que o usuário apresenta (desculpas para a escola, trabalho, etc.), falta de limites (dinheiro, horários, aceitação de agressividade) ou mesmo "fechar os olhos" para as demais conseqüências que o usuário passa a apresentar quando se torna abusador ou dependente. A família necessita participar ativamente do tratamento e do processo de recuperação do dependente, como núcleo de suporte fundamental do indivíduo. Esta tarefa, porém, não é nada fácil, dados os prejuízos sofridos pelos familiares durante o curso da dependência do álcool e/ou drogas (agressões, furtos domésticos, doenças do paciente, etc.). Para tanto, paralelamente ao tratamento individual, uma intervenção terapêutica familiar é sempre aconselhável.
Intervenções familiares no tratamento da Dependência MODELOS DE TERAPÊUTICA FAMILIAR
NÍVEL DE INTERVENÇÃO
OBJETIVOS
Orientação familiar
Intervenções familiares no tratamento da Dependência MODELOS DE TERAPÊUTICA FAMILIAR
NÍVEL DE INTERVENÇÃO
OBJETIVOS
Orientação familiar
Orientar os familiares da filosofia e abordagens do tratamento individual
Informar a família sobre o programa terapêutico e a inclusão do paciente e solicitar suporte familiar
Grupos psico-educacionais de familiares
Informar a família sobre o programa terapêutico e a inclusão do paciente e solicitar suporte familiar
Grupos psico-educacionais de familiares
Orientação sobre aspectos vivenciais (funcionamento familiar) com ênfase em aspectos do consumo e da dependência
Informar familiares se aspectos de relações pessoais e como estas são relevantes no abuso e dependência de substâncias
Informar familiares se aspectos de relações pessoais e como estas são relevantes no abuso e dependência de substâncias
Aconselhamento familiar
Contrato de tratamento familiar com o objetivo de resolução de problemas familiares específicos identificados no tratamento do dependente.
Auxiliar na solução de problemas identificados pelos integrantes da família que sejam relacionados ao consumo de drogas e/ou álcool
Auxiliar na solução de problemas identificados pelos integrantes da família que sejam relacionados ao consumo de drogas e/ou álcool
Terapia familiar
Contrato terapêutico com a família para intervenções com o objetivo de tratar disfunções crônicas e sistêmicas.
Abordar e procurar modificar áreas de comprometimento familiar (sistema), relacionando-as à dependência de substâncias psicoativas
Al-Anon
Grupo de auto-ajuda com enfoque familiar
Abordar e procurar modificar áreas de comprometimento familiar (sistema), relacionando-as à dependência de substâncias psicoativas
Al-Anon
Grupo de auto-ajuda com enfoque familiar
Não é considerado tratamento, porém possibilita compartilhar experiências com outras famílias de dependentes.
Tratamento para indivíduos com abuso ou dependência de cocaína e crack
Tratamento para indivíduos com abuso ou dependência de cocaína e crack
A dependência de cocaína é um transtorno passível de tratamento, ao contrário do que muitas pessoas pensam. Porém é certo que nenhum modelo de tratamento pode ser considerado eficaz para todos os pacientes. Indivíduos que desenvolvem Dependência de cocaína possuem diferentes características e necessidades. Estudos apontam uma boa relação custo-benefício do tratamento; o resultado mais comum dos diversos tratamentos é a redução do consumo nos anos posteriores, bem como a diminuição das atividades ilegais e do comportamento criminal do dependente. O tratamento, porém, necessita ser entendido como um processo contínuo, assim como modelos médicos utilizados em doenças crônicas, como Diabetes e hipertensão arterial. Nem todos os usuários necessitam de tratamento; muitos interrompem definitivamente o consumo após o surgimento dos primeiros prejuízos. Outros, todavia, continuam a usar a cocaína apesar das conseqüências evidentes que passam a apresentar. A necessidade do tratamento é muitas vezes determinada pelo envolvimento obsessivo do sujeito com a droga que passa a prejudicar os demais aspectos de sua vida.
O processo terapêutico inicia com medidas para trazer o paciente para os serviços de assistência. O dependente não procura tratamento por achar que está usando droga demasiadamente, mas sempre frente a "situações de crise", geralmente envolvendo trabalho, família, situação financeira, problemas legais, emergências médicas e rompimento de relacionamento afetivo. Uma forma de promover o acesso do indivíduo a tratamento é interromper a "FACILITAÇÃO" familiar, conforme discutido no capítulo anterior. No momento do ingresso ao tratamento, quase sempre o paciente tem a ilusão de poder retornar ao uso controlado da cocaína ("dar um tempo"). Esta ocorrência é impossível, pois uma vez cruzada a linha invisível da dependência, a capacidade de retorno a consumo ocasional ou controlado é definitivamente perdida (Washton, 1991). Muitas vezes o paciente demora meses ou anos, com inúmeras recaídas e aumento dos prejuízos, até que se conscientize deste fato.
Qualquer modelo de tratamento para a dependência da cocaína deve incluir alguns aspectos básicos, fundamentais para a obtenção de resultados positivos. A abstinência deve ser não somente da cocaína, mas de todas as drogas de abuso, primeiro e principal objetivo do processo terapêutico. Tanto o álcool como outras drogas deflagram "fissuras", mesmo meses (ou anos) após a interrupção da cocaína; como citado acima, o consumo tem um efeito desinibitório sobre o consumo de outras drogas (reduz a capacidade de evitar o consumo), aumentando ainda a impulsividade do paciente.
Aspectos psico-educacionais, tanto sobre a cocaína, álcool e outras drogas, como sobre a própria dependência devem sempre ser incluídos em qualquer modalidade terapêutica empregada. Este componente auxilia o paciente a compreender e aceitar a própria dependência. Deve incluir aspectos farmacológicos, princípios básicos da doença, sinais de recaída e formas de preveni-las, as conseqüências bio-psicossociais da dependência, aspectos familiares, capacitação e co-dependência (p.ex. cônjuge do dependente). O envolvimento familiar é fundamental. Outras medidas que costumam ser incluídas no processo são: terapia individual e familiar, participação de grupos de auto-ajuda, busca de atividades alternativas ao consumo de substâncias psicoativas, cuidados médicos, nutricionais e dentários, análises toxicológicas, intervenção farmacológica prescrita por profissional afeito às características da dependência e tratamento em regime de internação (hospitalar e comunidades terapêuticas). Quanto mais abrangente e completo o programa terapêutico, maior a chance de recuperação.
O processo terapêutico inicia com medidas para trazer o paciente para os serviços de assistência. O dependente não procura tratamento por achar que está usando droga demasiadamente, mas sempre frente a "situações de crise", geralmente envolvendo trabalho, família, situação financeira, problemas legais, emergências médicas e rompimento de relacionamento afetivo. Uma forma de promover o acesso do indivíduo a tratamento é interromper a "FACILITAÇÃO" familiar, conforme discutido no capítulo anterior. No momento do ingresso ao tratamento, quase sempre o paciente tem a ilusão de poder retornar ao uso controlado da cocaína ("dar um tempo"). Esta ocorrência é impossível, pois uma vez cruzada a linha invisível da dependência, a capacidade de retorno a consumo ocasional ou controlado é definitivamente perdida (Washton, 1991). Muitas vezes o paciente demora meses ou anos, com inúmeras recaídas e aumento dos prejuízos, até que se conscientize deste fato.
Qualquer modelo de tratamento para a dependência da cocaína deve incluir alguns aspectos básicos, fundamentais para a obtenção de resultados positivos. A abstinência deve ser não somente da cocaína, mas de todas as drogas de abuso, primeiro e principal objetivo do processo terapêutico. Tanto o álcool como outras drogas deflagram "fissuras", mesmo meses (ou anos) após a interrupção da cocaína; como citado acima, o consumo tem um efeito desinibitório sobre o consumo de outras drogas (reduz a capacidade de evitar o consumo), aumentando ainda a impulsividade do paciente.
Aspectos psico-educacionais, tanto sobre a cocaína, álcool e outras drogas, como sobre a própria dependência devem sempre ser incluídos em qualquer modalidade terapêutica empregada. Este componente auxilia o paciente a compreender e aceitar a própria dependência. Deve incluir aspectos farmacológicos, princípios básicos da doença, sinais de recaída e formas de preveni-las, as conseqüências bio-psicossociais da dependência, aspectos familiares, capacitação e co-dependência (p.ex. cônjuge do dependente). O envolvimento familiar é fundamental. Outras medidas que costumam ser incluídas no processo são: terapia individual e familiar, participação de grupos de auto-ajuda, busca de atividades alternativas ao consumo de substâncias psicoativas, cuidados médicos, nutricionais e dentários, análises toxicológicas, intervenção farmacológica prescrita por profissional afeito às características da dependência e tratamento em regime de internação (hospitalar e comunidades terapêuticas). Quanto mais abrangente e completo o programa terapêutico, maior a chance de recuperação.
A internação do dependente, ao contrário do que se acreditava antigamente, não é solução para todos os pacientes. Ao contrário, os estudos científicos realizados nas últimas décadas não comprovam nenhuma vantagem de um método hospitalar em relação a ambulatório para toda a população de dependentes que buscam, ou são levados para o tratamento. Pelo contrário, a internação é melhor entendida como um método de promoção de abstinência, apenas uma parte da recuperação do indivíduo, devendo SEMPRE ser associada a seguimento ambulatorial posterior. O tratamento em ambulatório, de fato apresenta algumas vantagens sobre a internação, por ser menos custoso (possibilita ao serviço o tratamento de um maior número de dependentes), causar menor interrupção na vida do indivíduo (muito dependentes que procuram tratamento, por exemplo, continuam a manter atividades sociais e ocupacionais importantes, auxiliando na manutenção de toda sua família). A internação carrega também um estigma social importante, que é delegado ao indivíduo. O dependente aceita, mais facilmente o tratamento ambulatorial e este modelo busca que o paciente lide com sua compulsão em seu "mundo real" (ao qual irá retornar muitas vezes despreparado após período de internação). Por outro lado, existem algumas indicações importantes de internação, apresentadas na tabela abaixo:
Indicações de internação para dependentes
PRINCIPAIS INDICAÇÕES DE INTERNAÇÃO PARA DEPENDENTES
Indicações de internação para dependentes
PRINCIPAIS INDICAÇÕES DE INTERNAÇÃO PARA DEPENDENTES
- Risco de suicídio, agressividade física importante, quadro psicótico
- Doenças médicas ou psiquiátricas associadas que indiquem internação (infarto de miocárdio, convulsões, etc.)
- Intensa disfunção de vida do dependente ou incapacidade de lidar com tarefas básicas de sua própria rotina (cuidados pessoais, alimentação, etc.)
- Dependência associada de substâncias que requerem tratamento hospitalar (abstinência de álcool ou opióides)
- Fracasso das tentativas de abordagem ambulatorial do dependente
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS RECOMENDADAS
- Andrade, A.G.; Queiroz, S.; Villaboim, R.M.C. et al: Uso de álcool e drogas entre alunos de graduação da Universidade de São Paulo. Revista ABP-APAL, n.º 19, p. 53-59, 1997.
- Carroll, M.: COCAINE AND CRACK. Springfield, Enslow, 1994.
- Galduróz, J.C.F.; Noto, A.R.; Carlini, E.A.: IV Levantamento sobre uso de drogas entre estudantes de 1º e 2º graus em 10 capitais brasileiras, São Paulo, CEBRID, 1997.
- Kosten, T.R.; Kleber, H.D.: CLINICIAN’S GUIDE TO COCAINE ADDICTION. New York, Guilford, 1992.
- Leite, M.C., Andrade, A.G.: COCAÍNA E CRACK: DOS FUNDAMENTOS AO TRATAMENTO, Porto Alegre, Ed. Artmed, 1999.
- Peck, R.G.: CRACK.. Rosen, New York, 1993.
- Scivoletto, S.; Andrade, E.R.: A cocaína e o adolescente. In Leite, M.C., Andrade, A.G.: COCAÍNA E CRACK: DOS FUNDAMENTOS AO TRATAMENTO, Porto Alegre, Ed. Artmed, 1999.
- Washton, A.M.: COCAINE ADDICTION: Treatment, Recovery and Relapse Prevention. New York, W.W. Norton , 1991.
- Weiss, R.D.; Mirin, S.M.; Bartel, R.L.: COCAINE. Washington, DC , American Psychiatric Press, 1994.
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